**O Dia em que uma Estranha Parecia Exatamente como a Sua Falecida Esposa**
Era um sábado chuvoso quando Tiago Mendes, um jovem empresário de tecnologia e viúvo, entrou num pequeno café de bairro com a sua filha de quatro anos, Beatriz. Há anos que não sorria. Desde a noite do acidente que levou a sua esposa, Catarina, o mundo parecia mais escuro—mais silencioso de uma forma que nem o sucesso nem o dinheiro conseguiam preencher.
O café cheirava a café torrado e pastéis quentes. Beatriz sentou-se junto à janela, balançando os pés e cantarolando uma música que só ela parecia conhecer. Tiago olhou para o menu, a mente nebulosa por outra noite mal dormida.
Foi então que Beatriz disse algo que lhe tirou o fôlego.
“Pai… aquela senhora parece a Mamã.”
Tiago levantou os olhos. Do outro lado da sala, uma jovem empregada conversava com um cliente. Os mesmos olhos castanhos suaves. O mesmo sorriso com a covinha. A mesma inclinação de cabeça que um dia iluminara o seu mundo.
O coração pareceu parar.
Catarina?
Impossível.
Ele conhecia cada detalhe do acidente: a colisão, o funeral, a papelada. Identificara o corpo pessoalmente.
E, no entanto… aquela mulher podia ser a sua gémea.
A empregada virou-se e cruzou o seu olhar. Por um instante, a expressão alegre dela hesitou, os olhos arregalando-se antes de desaparecer rapidamente na cozinha.
O pulso de Tiago acelerou.
Coincidência? Ou algo que nem conseguia nomear?
“Fica aqui, querida”, sussurrou para Beatriz, saindo do banco.
No balcão, perguntou discretamente: “A empregada com o rabo de cavalo preto—posso falar com ela?”
O empregado hesitou, mas acabou por desaparecer pela porta.
Os minutos arrastaram-se. Por fim, a empregada surgiu.
De perto, o parecido era ainda mais nítido—as mesmas sardas, a mesma pequena cicatriz junto à sobrancelha esquerda.
“Posso ajudar?”, perguntou, cautelosa mas calma.
“Parece… incrivelmente familiar”, disse Tiago, medindo as palavras. “Conheceu alguém chamada Catarina Mendes?”
Um breve relâmpago cruzou-lhe o rosto—desaparecido num instante.
“Não”, respondeu suavemente. “Lamento.”
Ele ofereceu um cartão de visita. “Se lembrar de algo, por favor, ligue.”
Ela sorriu educadamente, mas não o aceitou. “Tenha um resto de bom dia, senhor.”
A mão tremia-lhe ao afastar-se.
Naquela noite, Tiago não conseguiu dormir.
Seria possível?
Abriu o portátil e começou a pesquisar registos públicos. O café não tinha lista de funcionários, mas encontrou um único nome numa crítica na internet: Ana.
Ana.
Havia algo naquele nome que parecia… intencional.
De manhã, contratou um detetive discreto.
“Descubra tudo o que puder”, instruiu. “O nome dela é Ana. Trabalha num café na Rua do Salgueiro. Parece exatamente com a minha falecida esposa.”
Três dias tensos depois, o detetive ligou.
“Tiago”, disse lentamente, “o relatório do acidente da sua esposa não bate certo. Os registos dentários nunca foram confirmados. A mulher identificada como Catarina Mendes pode não ter sido a sua esposa. E a empregada? O nome legal dela é Ana Ribeiro—mas foi alterado cerca de seis meses depois do acidente. O nome original dela… era Catarina.”
Tiago apertou o telefone, tonto.
Catarina. Viva.
A viver sob um novo nome.
Na manhã seguinte, retornou ao café sozinho.
Quando Ana o viu, não fugiu. Tirou o avental e acenou para um beco sossegado ao lado do edifício.
“Perguntei-me quanto tempo demoraria”, disse, os olhos brilhando com lágrimas contidas.
A voz de Tiago mal se ouvia. “Porquê? Porque desaparecer?”
“Não foi planeado”, respondeu. “Eu devia estar naquele carro. Na última hora, fiquei em casa porque a Beatriz estava com febre. Horas depois, aconteceu o acidente. A minha carteira e o meu BI estavam no banco do passageiro. Toda a gente assumiu…”
Respirou fundo, trémula. “Quando vi as notícias, congelei. E, por um momento egoísta, pensei que talvez o mundo me estivesse a dar uma saída… uma bênção. As câmaras, a atenção constante, a pressão para ser perfeita—parecia que tinha perdido quem era. Queria recomeçar. Mas depois foi longe demais. Tive demasiado medo para voltar.”
Tiago engoliu em seco. “Todo este tempo… pensei que te tinha enterrado.”
Lágrimas escorriam-lhe pelo rosto. “Nunca deixei de vos amar, a ti e à Beatriz. Só me esqueci de me amar a mim mesma.”
“Então… vem para casa”, disse ele. “Não como um fantasma. Como tu.”
Naquela noite, Tiago levou-a a casa.
Beatriz correu para os braços da mãe com um suspiro de reconhecimento.
“Mamã?”, sussurrou.
Catarina agarrou a filha, soluçando. “Sim, querida. A Mamã está aqui agora.”
A reunião não foi um escândalo ou um espetáculo. Tiago usou discretamente os seus recursos para resolver os detalhes legais da identidade de Catarina.
Não houve comunicados à imprensa—apenas jantares em família, histórias antes de dormir, e uma cura lenta.
Semanas depois, depois de embalar Beatriz, Tiago perguntou: “Porque ficar desta vez?”
Catarina sorriu, as lágrimas a brilhar.
“Porque finalmente sei quem sou. Não apenas a mulher que queriam que eu fosse. Não apenas um nome nas notícias. Sou mãe. Sou eu mesma. E estou pronta para ser encontrada.”
Tiago pegou-lhe na mão e apertou-a com força.
E desta vez, ela não a soltou.