Vi a mão dela pairar sobre a minha taça de champanhe por exatamente três segundos. Três segundos que mudaram tudo. A taça de cristal estava na mesa principal, esperando pelo brinde, esperando que eu a levasse aos lábios e bebesse o que a minha nova sogra acabara de colocar dentro dela.
O pequeno comprimido branco dissolveu-se rapidamente, deixando quase nenhum traço nas borbulhas douradas. Carla não sabia que eu estava a observar. Ela pensou que eu estava do outro lado do salão, a rir com as minhas damas de honra, perdida na alegria do meu dia de casamento. Ela pensou que estava sozinha. Pensou que estava segura.
Mas eu vi tudo. O meu coração batia descontroladamente contra as costelas enquanto a via a olhar em volta, nervosa, os dedos bem cuidados a tremer quando os afastou do meu copo. Um sorriso pequeno e satisfeito curvou os seus lábios, o tipo de sorriso que fez o meu sangue gelar. Não pensei. Apenas aja.
Quando Carla voltou ao seu lugar, alisando o vestido de seda caro e afixando o sorriso de mãe do noivo, eu já tinha feito a troca. O meu copo estava agora à frente da cadeira dela. O dela, o limpo, esperava por mim.
Quando o Diogo se levantou, elegante no seu fato ajustado, e ergueu a champanhe para o primeiro brinde da nossa vida de casados, senti que estava a ver tudo como se estivesse num sonho. As suas palavras sobre amor e eternidade soaram estranhas nos meus ouvidos. A mãe dele estava ao seu lado, radiante, levando a champanhe adulterada aos lábios.
Devia tê-la parado. Devia ter gritado, batido no copo e exposto aquilo na frente de todos. Mas não o fiz. Queria ver o que ela tinha planeado para mim. Queria prova. Queria que todos vissem quem a Carla realmente era por trás daquela máscara perfeita, de mulher caridosa e pilar da comunidade.
Por isso, observei a minha sogra beber o veneno que preparara para mim. E depois, o inferno desatou.
Na manhã do meu casamento, acordei a acreditar em contos de fadas. A luz do sol entrava pelas janelas da suite nupcial no Solar das Rosas, banhando tudo num dourado suave. A minha melhor amiga, Andreia, já estava acordada, pendurando o vestido—um deslumbrante vestido de renda em marfim—perto da janela, onde a luz o iluminava.
“Hoje é o grande dia, Leonor,” sussurrou, os olhos brilhantes. “Vais casar com o Diogo.”
Sorri até me doerem as faces. Claro. O meu Diogo. Depois de três anos juntos, finalmente íamos fazer isto, finalmente tornar-nos marido e mulher.
“Não acredito que isto seja real,” disse, apertando as mãos contra o estômago, onde borboletas pareciam ter-se instalado para sempre.
A minha mãe entrou, o cabelo já pronto, a maquilhagem perfeita, carregando uma bandeja com café e pastéis de nata. “A minha menina linda,” disse, pousando a bandeja e abraçando-me com força. “Estou tão orgulhosa de ti.”
A minha irmã mais nova, Inês, entrou atrás dela, aos saltos. “As flores acabaram de chegar e estão lindíssimas! Leonor, tudo está perfeito!”
Tudo estava perfeito. Ou assim eu pensava.
A cerimónia correu sem falhas. Desci o corredor de braço dado com o meu pai, os olhos dele húmidos de lágrimas que tentava esconder. A capela histórica estava decorada com milhares de rosas brancas e luzes de velas. O Diogo estava no altar, parecendo o sonho que eu sempre tivera, o cabelo escuro perfeitamente penteado, os olhos cinzentos fixos nos meus com uma intensidade que me tirou o fôlego.
Quando ergueu o meu véu e sussurrou, “És a coisa mais bonita que já vi,” acreditei que este era o começo do meu final feliz. O melhor amigo dele, Gonçalo, estava ao seu lado como padrinho, a sorrir. O irmão mais novo do Diogo, o Martim, de dezanove anos, parecia desconfortável no fato, mas sorriu com calor para mim. Sempre tivemos uma boa relação.
A Carla estava na primeira fila, a secar as lágrimas com um lenço de renda, interpretando perfeitamente o papel da mãe emocionada. O pai do Diogo, o Rui, estava rígido e formal ao lado dela, a expressão inescrutável como sempre. Dissemos os nossos votos. Trocámos as alianças. Beijámo-nos enquanto todos festejavam. Devia ter sabido que era perfeito demais para durar.
A receção realizou-se no salão nobre do solar, um espaço deslumbrante com tetos altos, lustres de cristal e janelas do chão ao teto com vista para os jardins bem cuidados. Trezentos convidados enchiam a sala: amigos, família, colegas e parentes distantes que mal conhecia. A primeira hora foi mágica. O Diogo e eu tivemos a nossa primeira dança para “Agora É que São Elas” pelos Doce. Dancei com o meu pai, que chorou sem vergonha. O Diogo dançou com a mãe, que sorriu aquele sorriso apertado e controlado que sempre usava.
Estava a conversar com a Andreia e a minha prima Raquel perto da pista de dança quando senti pela primeira vez o arrepio de desconforto na nuca, aquele sexto sentido estranho que diz que alguém está a observar-nos. Virei-me e apanhei a Carla a olhar fixamente para mim do outro lado da sala. Não era o olhar caloroso de uma sogra a admirar a nora. Era algo frio, algo calculista.
Quando os nossos olhares se cruzaram, a expressão dela mudou para um sorriso afável. Ergueu ligeiramente a taça de champanhe na minha direção, como se brindasse a mim. Sorri de volta, forçada, mas o estômago revirou-se.
“Estás bem?” perguntou a Andreia, tocando-me no braço.
“Estou,” menti. “Só estou sobrecarregada. Feliz.”
Mas não estava bem. Algo estava errado, mesmo que não soubesse o quê. A Carla nunca me dera as boas-vindas à família. Desde que o Diogo nos apresentou, há dois anos, ela foi fria, educada, mas distante. Nunca dissera nada francamente cruel, mas havia mil pequenos cortes: comentários sobre o meu trabalho como professora não ser suficientemente prestigiado, perguntas sobre a minha família que pareciam interrogatórios, sugestões de que o Diogo devia manter as opções em aberto porque “ainda era tão novo.”
O Diogo sempre minimizou. “A mãe é só protetora,” dizia. “Ela vai mudar.” Mas nunca mudou.
As semanas antes do casamento foram tensas. A Carla tinha opiniões sobre tudo: o local era modesto demais, o meu vestido era simples demais, a lista de convidados tinha família minha a mais e dela a menos. Tentou tomar conta do planeamento, sugerindo adiar e “fazer como deve ser” com a sua organizadora de eventos, o seu catering, a sua visão.
Eu resisti. Este era o meu casamento—meu e do Diogo. Ela sorriu com frieza e disse, “Claro, querida. O que achares melhor.” Mas os olhos dela eram gelo. Agora, a vê-la mover-se pela multidão, perfeitamente vestida num vestido de marca, perfeitamente composta, o desconforto cresceu.
“Os brindes vão começar,” disse a Inês, aparecendo com uma nova taça de champanhe. “Estás pronta?”
Agarrei o copo, o cristal fresco na minha mão. “Tão pronta quanto possoA verdade libertou-me, mas o preço foi a desconfiança nos olhos do Diogo, um lembrete de que mesmo os contos de fadas mais perfeitos podem esconder veneno nos seus finais felizes.