Vi a mão dela pairar sobre a minha taça de champanhe durante exatamente três segundos. Três segundos que mudaram tudo. A taça de cristal estava sobre a mesa principal, à espera do brinde, à espera que eu a levasse aos lábios e bebesse o que a minha nova sogra, Dona Isabel, acabara de misturar ali.
O pequeno comprimido branco dissolveu-se rapidamente, mal deixando rastro nas bolhas douradas. Carolina não sabia que eu a observava. Achava que eu estava do outro lado do salão, rindo com as minhas damas de honra, perdida na alegria do meu dia de casamento. Achava que estava sozinha. Achava que estava segura.
Mas eu vi tudo. O meu coração batia forte contra as costelas enquanto a via olhar em volta, nervosa, os dedos impecavelmente pintados a tremerem ao afastar-se da minha taça. Um sorriso pequeno e satisfeito curvou os seus lábios, o tipo de sorriso que me fez o sangue gelar. Não pensei. Simplesmente agi.
Quando Carolina voltou ao seu lugar, alisando o vestido de seda caro e compondo o seu sorriso de mãe do noivo, eu já tinha feito a troca. A minha taça estava agora à frente do seu lugar. A dela, a intocada, esperava por mim.
Carolina ergueu a taça primeiro.
Os seus diamantes cintilavam sob a luz dos lustres enquanto sorria — aquele sorriso perfeito e ensaiado que enganava todos, menos a mim. O fotógrafo disparava flashes, os convidados riam, e a banda começou uma melodia suave de jazz.
“À família,” disse ela, a voz doce e oca.
Todos levantaram os copos.
“À família,” repeti, o pulso tão acelerado que o sentia nos ouvidos.
Os nossos olhares cruzaram-se através da mesa principal. Os dela estavam brilhantes demais, a expressão um pouco demasiado expectante.
E então — ela bebeu.
Um gole lento, deliberado.
Observei o seu pescoço a mover-se, as bolhas a deslizarem pelos lábios pintados. Todos os instintos gritavam que isto não podia estar a acontecer.
Mas estava.
E quando a sua taça pousou suavemente sobre a toalha, soube que algo irreversível tinha começado.
Uma Hora Depois
A receção continuava animada — risos, talheres a tilintar, o aroma de pato assado e perfume de champanhe. O meu marido, Duarte, estava na pista de dança com os seus padrinhos, as faces coradas de felicidade.
Sorri quando ele olhou para mim. Até acenei.
Mas por dentro, estava a desfazer-me.
De minutos em minutos, olhava para Carolina. Ela estava sentada ao lado do marido, a sorrir demasiado, a mão ocasionalmente a tocar a têmpora, como se algo a incomodasse.
No início, pensei que fosse culpa.
Depois, reparei que a cor lhe fugia do rosto.
Piscou os olhos rapidamente, uma, duas vezes — depois agarrou a borda da mesa enquanto a pulseira de diamantes escorregava pelo pulso.
Alguma coisa lhe estava a acontecer.
O que quer que tivesse colocado no meu champanhe… agora corria nas suas próprias veias.
O estômago embrulhou-se.
Meu Deus.
E se ela não tivesse querido matar-me? E se fosse outra coisa — algo para me humilhar, ou deixar-me doente, ou…
Um baque suave interrompeu os meus pensamentos.
A cadeira de Carolina afastou-se. Ela balançou uma — duas vezes — e desmoronou, a cabeça a bater no chão com um som abafado que cortou a música.
Os gritos seguiram-se.
A banda parou. Os convidados agitaram-se.
Duarte gritou, “Mãe!” e ajoelhou-se ao lado dela.
Alguém chamou um médico. Outro pediu uma ambulância.
Eu fiquei ali, paralisada, a taça ainda fria na minha mão.
Duas Horas Depois
O salão estava vazio. As luzes baixas. Os clarões vermelhos e azuis da ambulância refletiam-se nas paredes de mármore lá fora.
Carolina tinha sido levada para o hospital. Duarte foi com ela. Eu fiquei para trás, rodeada de bolo meio comido e flores murchas.
A organizadora do casamento murmurou algo sobre adiar a lua de mel. Acenei distraída.
O telemóvel vibrou. O nome de Duarte iluminou o ecrã.
Atendi com as mãos a tremer. “Como ela está?”
Ele expirou, inquieto. “Estão… a fazer exames. Ela acordou, mas está confusa. Os médicos dizem que a tensão arterial caiu de repente — acham que pode ter sido uma reação alérgica.”
Alérgica. O meu pulso acelerou.
“Ela vai ficar bem,” acrescentou rapidamente. “Vão mantê-la em observação durante a noite.”
Não sabia se sentir alívio ou medo.
Porque agora, haveria perguntas.
E Carolina? Ela teria respostas.
Na Manhã Seguinte
Quando Duarte e eu chegámos ao hospital, Carolina estava sentada na cama, pálida mas lúcida.
Os olhos encontraram os meus imediatamente. Algo frio e afiado brilhou neles.
“Oh, querida,” disse, a voz leve, demasiado doce. “Que noite horrível.”
Sorri ligeiramente. “Ainda bem que estás melhor.”
“Eu também,” murmurou, e então os lábios curvaram-se pouco. “Mas é engraçado… não me lembro bem como aconteceu.”
“Talvez devesses descansar,” sugeriu Duarte, colocando um ramo de lírios brancos na mesa.
“Vou descansar, querido,” sussurrou. “Mas antes que vás embora — gostaria de falar com a tua mulher a sós. Só um momento.”
Duarte hesitou, mas beijou-lhe a testa. “Não forces, está bem?”
Quando ele saiu, o ar no quarto mudou — pesado, tenso.
Carolina virou-se devagar para mim. A doçura desapareceu-lhe do rosto.
“Trocaste as taças,” disse.
Não respondi.
Os lábios dela contorceram-se. “Pensas que não reparei? Vi que a marca do batom não era o meu. Esperta como és.”
A garganta secou. “O que puseste na minha bebida?”
Ela sorriu pouco. “Não gostarias de saber.”
“Carolina—”
“Não era veneno,” afirmou secamente. “Não sou uma assassina. Era… um sedativo. Leve. Do tipo que te deixaria tonta e confusa. Tropeçarias, talvez desmaiasses. Os jornais chamar-te-iam instável. E então Duarte veria a verdade — que não és digna desta família.”
As palavras cortaram-me como vidro.
“Ias humilhar-me?”
“Estava a proteger o meu filho,” disse calmamente. “De ti.”
Avançei um passo, a voz a tremer. “Quase te mataste a ti mesma.”
O sorriso dela vacilou. Pela primeira vez, vi um lampejo de medo.
“Não queria que isto acontecesse,” sussurrou. “Pensei—”
“Pensaste que podias controlar tudo.”
Silêncio.
Então ela inclinou-se para a frente, o tom venenoso. “Não pertences aqui. Não vens de nada. Enganaste-o — com esses teus olhos grandes e a tua história triste de órfã. Mas eu vejo-te. Só queres o dinheiro dele.”
Algo dentro de mim partiu-se.
“Não fazes ideia de quem eu sou,” disse baixinho.
Carolina sorriu com arrogância. “Oh, mas eu sei. Investiguei-te, querida. Cada linha, cada segredo. Cresceste num orfanato. Sem pais. Sem ligações”Mas no final, fui eu quem descobriu o segredo mais sombrio da família dela, e quando as cartas caíram, Carolina percebeu que já não havia champanhe no mundo que pudesse lavar a sua vergonha.”