Menino implora por presença de clube de motociclistas no funeral do pai policial

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Os dedinhos dele ainda estavam manchados de tinta de caneta, e a capa do Super-Homem estava vestida ao contrário.

O café ficou em silêncio absoluto quando quinze membros dos Lobos de Ferro MC encararam o menino que não devia pesar vinte quilos nem molhado.

“A minha mãe disse que não posso pedir a vocês”, ele declarou, com o queixo erguido em desafio. “Mas ela só chora o tempo todo, e os meninos maus da escola disseram que o papá não vai para o céu sem homens assustadores para protegê-lo.”

Zé Grande — duas missões no Afeganistão, uma caveira tatuada no pescoço — pegou o papel com cuidado.

Era um desenho infantil de bonecos de palito em motocicletas rodeando um caixão, com “POR FAVOR, VENHAM” escrito em letras espelhadas.

“Onde está a tua mãe, pequenino?”, perguntou Zé em voz baixa.

O menino apontou para a janela, onde um Toyota velho estacionado abrigava uma mulher jovem com a cabeça entre as mãos. “Ela tem medo de vocês. Toda a gente tem. Por isso é que eu preciso de vocês.”

Eu já tinha visto o Zé partir a mandíbula de um homem por desrespeitar a sua mota. Mas as suas mãos tremiam ao ler o resto do papel — uma data, no dia seguinte, e um endereço: o Cemitério da Alameda.

“Como se chamava o teu pai?”, perguntou alguém.

“Agente Marco Sousa”, disse o menino com orgulho. “Ele era polícia. Um homem mau matou-o.”

O silêncio ficou ainda mais pesado.

Polícias e motards nunca foram aliados naturais. A maioria de nós já tinha sido importunada, discriminada, até agredida pela polícia. E agora o filho deste agente pedia-nos para honrar o seu pai caído.

Zé levantou-se devagar. “Como te chamas, Super-Homem?”

“Pedro. Pedro Sousa.”

“Então, Pedro Sousa”, disse Zé, ajoelhando-se à sua altura, “diz à tua mãe que o teu papá vai ter o maior, mais barulhento e mais assustador acompanhamento para o céu que um agente já teve.”

Os olhos do menino arregalaram-se. “A sério? Vocês vêm?”

“Irmão”, resmungou Cobra, do canto, dividido. “Ele era polícia.”

“Era um pai”, respondeu Zé, sem desviar o olhar de Pedro. “E este pequeno guerreiro acabou de fazer a coisa mais corajosa que vi este ano.”

O que aconteceu no funeral no dia seguiu fez manchetes em todo o país.

Na manhã seguinte, cheguei ao cemitério duas horas mais cedo. Pensei que seria o primeiro lá — talvez avaliar a situação, preparar-me para o desconforto.

Não cheguei perto.

O estacionamento já estava a encher de motas. Não só dos Lobos de Ferro, mas de clubes de três distritos. Os Vingadores, as Fénix de Aço, os Desertores, até os Cavaleiros de Cristo. O correr da notícia foi como fogo numa noite.

“Isto é surreal”, murmurei para o Zé, que organizava as motas como um general.

“O miúdo pediu homens assustadores”, encolheu os ombros. “Vai tê-los.”

Às 9h, mais de trezentas motas estavam reunidas. O funeral só começava às 10, mas estávamos prontos.

Depois, começaram a chegar os polícias.

A tensão dava para cortar com uma faca. Dois grupos que normalmente se evitavam — ou brigavam — ficaram em lados opostos do cemitério.

O Agente Marques, um sargento da esquadra do Sousa, avançou. A mão não estava na arma, mas perto.

“O que estão a fazer aqui?”, perguntou. O tom não era hostil, mas também não era acolhedor.

Zé aproximou-se. “Prestar respeito.”

“A um polícia? Desde quando—”

“Desde que um miúdo de cinco anos entrou num café e pediu”, cortou Zé. “O filho do teu camarada é mais corajoso que a maioria dos homens que conheço.”

Antes que Marques respondesse, uma vozinha cortou o ar:

“OS HOMENS ASSUSTADORES VÊM!”

Pedro soltou-se da mãe e correu a toda a velocidade, o fato miniatura a esvoaçar, a capa do Super-Homem ainda ao contrário. Atirou-se para as pernas do Zé, abraçando-as com força.

“Vocês vieram! Vieram mesmo! O papá vai ficar tão seguro agora!”

Vi a expressão de Marques mudar, algo rachar naquele rosto profissional. Outros agentes viram também — aquele menino pequeno agarrado a um motard como se fosse a salvação.

A mãe de Pedro, Carolina, aproximou-se cautelosamente. Era jovem, talvez vinte e cinco anos, os olhos fundos de dor.

“Peço desculpa”, sussurrou. “Eu disse-lhe para não vos incomodar. Nem sei como ele vos encontrou—”

“Senhora”, interrompeu Zé, suave. “O seu filho não fez nada de errado. Pediu ajuda. Nós respondemos.”

“Mas o Marco… o meu marido… ele…”, a voz dela quebrou. “Ele prendeu alguns dos vossos. Era rígido com as infrações de trânsito. Não entendo por que—”

“O seu marido estava a fazer o seu trabalho”, disse Cobra, avançando. “Nós fazemos o nosso. Hoje, o nosso trabalho é garantir que o filho dele saiba que o pai importava.”

O diretor do funeral aproximou-se, visivelmente atordoado. “Desculpem, mas não podemos ter trezentas motas no cortejo. Regulamento municipal—”

“Eu trato disso”, disse o Agente Marques, de repente.

Todos viraram-se para olhar para ele.

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