Menino de sete anos pagou motociclistas para atacar namorado da mãe

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O motoqueiro olhou para os sete euros em moedas que o menino moribundo empurrou pela cama do hospital, implorando: “Machuquem o homem que fez isso comigo.”

O nome dele era Rodrigo. Sete anos. Hemorragia interna. Costelas partidas. Inchaço no cérebro. Os aparelhos que o mantinham vivo soavam como se já estivessem chorando por ele.

Sua mãozinha agarrou meu colete de couro com a pouca força que lhe restava, e ele sussurrou com os dentes quebrados.

“O dinheiro da fada dos dentes,” disse, com bolhas de sangue nos lábios. “Juntei tudo. Sete euros. É suficiente para contratar motoqueiros, não é? Para machucar gente má? Por favor. Antes que ele mate a minha irmãzinha também.”

A enfermeira tentou puxá-lo de volta, pedindo para ele descansar, mas Rodrigo não soltou meu colete. Seus olhos, um inchado fechado, o outro verde-claro e desesperado, atravessaram-me.

“Ele disse à Mamãe que faria parecer um acidente. Que eu caí. Mas eu não caí. Ele me empurrou escada abaixo catorze vezes até que algo dentro de mim quebrou.”

Foi quando percebi que isso não era sobre vingança. Era o testemunho de uma criança morrendo. E nós éramos suas únicas testemunhas.

Tenho andado de moto por quarenta e dois anos. António “Tonho” Mendes. Sessenta e seis anos. Já vi guerra. Já vi morte. Achava que já tinha visto de tudo.

Mas não tinha visto nada até aquela terça-feira no Hospital de Crianças.

Estávamos lá para nossa visita mensal. Lendo para as crianças. Levando peluches. Cinco de nós da Turma do Asfalto — eu, o Zé Grande, o Fumaça, o Lisboeta e o Lata Velha. Fazíamos isso há anos. As crianças adoravam o couro, as motas no estacionamento que elas podiam ver da janela.

O quarto 318 não estava na nossa lista. Ouvimos choro lá dentro. Não era choro de criança. Era choro de adulto. Daquele tipo que vem quando a alma está sendo rasgada.

Uma enfermeira saiu, com o rosto branco.

“Está tudo bem?” perguntou o Zé Grande.

“Não,” ela sussurrou, olhando em volta. “Nada está bem. Aquele menino… o que fizeram com ele…” Ela parou. “Não devia dizer nada.”

“Que menino?” perguntei.

Ela olhou para nossos coletes. Nossos patches. E tomou uma decisão.

“Rodrigo Lopes. Sete anos. Chegou há duas horas. Caiu das escadas, diz a mãe. Mas sou enfermeira pediátrica há vinte anos. Crianças não têm ferimentos defensivos de quedas.”

“Ferimentos defensivos?”

“As mãos. Cortadas. Como se estivesse tentando se proteger de algo. Ou alguém.”

O choro do quarto aumentou. Uma voz feminina: “Por favor, meu amor, acorda. A Mamãe pede desculpa. A Mamãe pede tanto desculpa.”

“Podemos visitá-lo?” perguntei.

“Só família. Mas…” Ela olhou para o quarto, depois para nós. “A mãe dele foi ao banheiro. Se vocês entrassem por trinta segundos…”

Entramos.

Rodrigo era tão pequeno naquela cama. Máquinas por todo o lado. Tubos. Fios. Seu rosto estava inchado além do reconhecimento. Ambos os braços engessados. Ligaduras no torso.

Mas seus olhos estavam abertos. Um malaberto, devido ao inchaço. Mas aberto.

Ele nos viu e não pareceu assustado. A maioria das crianças, ao ver cinco motoqueiros grandes, entraria em pânico. Mas não o Rodrigo.

“Anjos?” ele sussurrou. “Já morri?”

“Não, miúdo,” respondi baixinho. “Somos só motoqueiros. Visitamos crianças.”

“Motoqueiros?” Seu olho bom abriu um pouco mais. “Motoqueiros de verdade? Como na TV? Os que protegem as pessoas?”

“Sim, miúdo. Motoqueiros de verdade.”

Foi quando ele tentou sentar. Não conseguiu. As máquinas começaram a apitar. Mas ele alcançou debaixo do travesseiro, puxou um saquinho de pano. Moedas tilintaram lá dentro.

“Tenho dinheiro,” ele disse. “Sete euros. Em moedas. Da fada dos dentes.”

“Isso é ótimo, miúdo—”

“Não!” Ele agarrou meu colete com a mão enfaixada. “Ouçam. Por favor. Preciso contratar vocês.”

“Contratar-nos?”

“Para machucá-lo. O Rui. O namorado da Mamãe. Antes que ele machuque a Leonor.”

“Quem é a Leonor?”

“Minha irmãzinha. Tem dois anos. Ele disse que é a próxima. Disse que se eu contar o que ele faz, a Leonor também cai das escadas.”

O Zé Grande ajoelhou-se ao lado da cama. “Rodrigo, o que o Rui faz?”

“Empurra. Bate. Queima.” Ele levantou um pouco o roupão do hospital. Cicatrizes antigas. Queimaduras de cigarro. Marcas de cinto. Camadas de abuso. “Mas eu nunca contei. Nunca. Nem quando a professora perguntou. Nem quando o médico perguntou. Por causa da Leonor.”

“Por que está nos contando?” perguntou o Lisboeta.

“Porque estou morrendo,” disse Rodrigo, simplesmente. “Posso sentir. Algo dentro está partido. Mesmo partido. E quando eu me for, ninguém vai proteger a Leonor.”

“A tua mãe—”

“A Mamãe tem medo. O Rui também bate nela. Mas mais devagar. Onde não dá para ver. Ela tenta pará-lo às vezes, mas ele é forte demais.”

A porta abriu. Uma mulher entrou — magra, exausta, com próprias nódoas negras mal escondidas sob maquilhagem.

Ela nos viu e entrou em pânico. “Quem são vocês? Sa”Saíram! Fora daqui!” ela gritou, mas o Rodrigo agarrou-lhe a mão e sussurrou: “Mamãe, eles vão ajudar a Leonor,” e foi então que a mãe, entre lágrimas, contou a verdade e os motoqueiros perceberam que aquelas sete moedinhas, juntadas com esperança por um menino corajoso, valiam mais que todo o ouro do mundo.

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