O meu marido João e eu estamos casados há oito anos. Nunca tivemos muito, mas a nossa casinha em Coimbra estava sempre cheia de risos e calor. João era calado por natureza — o tipo de homem que chegava do trabalho, abraçava a nossa filha, me dava um beijo na testa e nunca reclamava de nada.
Mas há alguns meses, comecei a notar algo estranho. Ele estava sempre cansado, a sua coceira nas costas era constante, e ele se coçava tanto que as suas camisas ficaram cheias de marcas de pilling. Pensei que não era nada — talvez picadas de mosquito ou alergia ao sabão em pó.
Até que uma manhã, enquanto ele dormia, levantei a sua camisa para passar um creme — e congelei.
Havia pequenas bolhas vermelhas nas suas costas. No início, eram apenas algumas. Mas com o passar dos dias, mais apareceram — dezenas delas, agrupadas em padrões estranhos e simétricos. Pareciam quase como ninhos de ovos de inseto sob a sua pele.
O meu coração disparou. Algo estava terrivelmente errado.
“João, acorda!” — sacudi-o, em pânico. — “Precisamos ir ao hospital agora!”
Ele riu, sonolento, dizendo: “Calma, querida, é só uma irritação na pele.”
Mas eu me recusei a aceitar. “Não” — disse, tremendo. — “Nunca vi nada assim. Por favor, vamos.”
Corremos para a urgência do Hospital Universitário de Coimbra. Quando o médico levantou a camisa de João, a sua expressão mudou instantaneamente. O médico, antes calmo e profissional, ficou pálido e gritou para a enfermeira ao lado:
“Chamem a polícia — agora mesmo!”
O meu sangue gelou. Chamar a polícia? Por causa de uma irritação na pele?
“O que está acontecendo?” — gaguejei. — “O que ele tem?”
O médico não respondeu. Em instantes, mais dois funcionários correram para a sala. Cobriram as costas de João com lençóis esterilizados e começaram a me questionar com urgência:
“O seu marido teve contacto com substâncias químicas recentemente?”
“O que ele faz no trabalho?”
“Alguém na sua família teve sintomas parecidos?”
A minha voz falhou ao responder: “Ele trabalha na construção civil. Nos últimos meses, esteve num novo canteiro de obras. Andava cansado, mas achámos que era só o trabalho.”
Quinze minutos depois, dois agentes da PSP chegaram. A sala ficou em silêncio, só o barulho dos aparelhos médicos ecoando. As minhas pernas fraquejaram. Por que estava a polícia ali?
Depois de uma longa espera, o médico voltou. A sua voz era calma, mas firme:
“Dona Miller” — disse suavemente — “não entre em pânico. O seu marido não está doente. Essas marcas não foram causadas naturalmente. Acreditamos que alguém fez isto de propósito.”
Senti o meu corpo inteiro tremer. “Alguém… fez isto?”
Ele confirmou. “Suspeitamos que ele foi exposto a um produto químico — provavelmente algo corrosivo ou irritante que foi aplicado diretamente na pele. Causou uma reação tardia. A senhora trouxe-o a tempo.”
Lágrimas escorreram pelo meu rosto. “Mas quem iria mago-lo? E… por quê?”
A polícia começou a investigação imediatamente. Perguntaram sobre os colegas recentes, a rotina dele, alguém que pudesse ter tido acesso a ele no trabalho. Foi aí que me lembrei — ultimamente, João chegava mais tarde do que o habitual. Disse que ficava para “limpar o local”. Uma vez, notei um cheiro forte de químicos nas suas roupas, mas ele ignorou.
Quando mencionei isso, um dos agentes trocou um olhar grave com o médico.
“É isso” — disse o inspetor, baixinho. — “Isto não foi acidental. Alguém provavelmente passou um composto corrosivo na pele dele — diretamente ou nas roupas. Foi um ato de agressão.”
As minhas pernas falharam. Apenas me segurei na cadeira, tremendo.
Após alguns dias de tratamento, João melhorou. As bolhas começaram a sumir, deixando cicatrizes discretas. Quando finalmente conseguiu falar, pegou na minha mão e sussurrou:
“Peço desculpa por não te dizer antes. Há um homem no trabalho — o capataz. Ele queria que eu assinasse faturas falsas de materiais que nunca chegaram. Recusei. Ele me ameaçou, mas nunca pensei que faria algo assim.”
O meu coração partiu-se. O meu marido, gentil e honesto, quase morreu porque se recusou a ser corrupto.
A polícia confirmou tudo mais tarde. O homem — um subempreiteiro chamado Rui Carvalho — tinha esfregado um produto irritante na camisa de João enquanto ele se trocava no canteiro de obras. Queria “dar-lhe uma lição” por não se alinhar.
Rui foi preso, e a empresa abriu uma investigação interna.
Quando ouvi a notícia, não sabia se sentia alívio ou raiva. Como podia alguém ser tão cruel — e tudo por dinheiro sujo?
Desde aquele dia, nunca mais subestimei um momento com a minha família. Antes, achava que segurança era trancar as portas e evitar estranhos. Agora sei — às vezes, o perigo esconde-se naqueles em que achamos que podemos confiar.
Mesmo agora, quando me lembro daquele momento — o médico gritando “Chamem a polícia!” —, ainda sinto o peito apertar. Mas aquele momento também salvou a vida do João.
Ele costuma dizer-me agora, enquanto passa os dedos pelas cicatrizes discretas nas costas:
“Talvez Deus quisesse lembrar-nos do que realmente importa — que ainda temos um ao outro.”
Eu aperto-lhe a mão e sorrio, mesmo com lágrimas.
Porque ele tem razão. O amor verdadeiro não se prova nos dias tranquilos — mas sim na tempestade, quando nos recusamos a largar as mãos um do outro.