**No Meio da Maratona**
No meio de uma maratona, um rapaz pobre de pele morena dava tudo de si, correndo por um futuro melhor. A vitória estava ao alcance. Mas, bem quando se aproximava, a única corredora à sua frente desfaleceu. Sem hesitar, ele parou. Levantou-a nos braços e ajudou um único médico a salvá-la. Desistiu da corrida. Não houve aplausos, nem holofotes, apenas silêncio. Dois dias depois, quando menos esperava, o pai dela apareceu à sua porta—e o que aconteceu a seguir mudaria a sua vida para sempre. Antes de começarmos, qual é o seu desporto favorito? Comente abaixo!
O Rui não parecia um corredor. Pelo menos não daqueles que treinam com fatos de treino reluzentes e pastilhas de eletrólitos à cintura. Tinha catorze anos, magro como um palito, pele escura e olhos sérios. Todas as manhãs, antes do sol nascer sobre as barracas do bairro social onde vivia, já estava de pé e a sair—o seu bafo visível no ar enquanto distribuía jornais numa bicicleta velha e depois corria parte do caminho para a escola para poupar tempo.
Os ténis—se ainda se podiam chamar assim—estavam a desfazer-se. As solas finas como cartão. Um atacador fora substituído por um fio descarnado de coluna de som, e o tecido estava tão rasgado que as meias, também cheias de buracos, apareciam a cada passo. Mas, de algum modo, quando corria, movia-se com uma graça e força que faziam as pessoas parar para olhar, mesmo sem entenderem porquê.
O Rui vivia com a mãe, o pai e dois irmãos mais novos num T2 minúsculo. O pai trabalhava no turno da noite numa bomba de gasolina à beira da autoestrada, e a mãe limpava casas quando arranjava horas. O Rui sabia como as coisas estavam apertadas. Sabia quais as contas em atraso, quais os interruptores que não funcionavam, e quando não havia comida suficiente, dizia que não estava com fome para o irmão poder comer mais. Era a vida—dura, silenciosa e sem muitas opções. Mas o Rui tinha uma coisa: sabia correr.
Não sabia porque era rápido. Simplesmente era. E apesar de ninguém nunca ter prestado muita atenção, aquilo fazia com que se sentisse forte de um modo que nada mais conseguia. Isso mudou no dia em que o Sr. Almeida o viu correr.
Foi na aula de Educação Física. A escola não tinha equipamento decente, por isso a maioria dos miúdos andava pelo campo. O Rui não. Arrancou quando o professor deu o sinal e deixou a turma toda a comer poeira, os ténis esfarrapados a bater com cada passada. O Sr. Almeida—cabelo grisalho, magro, olhos penetrantes—já tinha visto muitos miúdos ao longo dos anos. Mas algo no Rui chamou-lhe a atenção. Antigo corredor de competição, o Sr. Almeida tinha olho para a técnica, e a forma do Rui—o seu ritmo natural, o tempo perfeito—era inconfundível.
Depois da aula, o Sr. Almeida aproximou-se, com uma prancheta debaixo do braço.
“Já pensaste em treinar a sério?” perguntou.
O Rui encolheu os ombros. “Não tenho tempo. Trabalho depois das aulas.”
O Sr. Almeida não insistiu, mas observou. Na semana seguinte, e na outra, esperou-o à saída da escola. Quando o Rui terminava o turno no supermercado, trazia água, um cronómetro e, por fim, um par de ténis velhos mas resistentes do seu próprio armário.
“Não são nada de especial,” disse, entregando-lhos. “Mas duram mais do que os que tens.”
O Rui hesitou. “Os meus pais não vão gostar,” respondeu. “Eles acham que correr é perder tempo.”
E achavam. A mãe foi direta: “Rui, correr não paga contas. Não compra os remédios da asma da tua irmã. Trabalhas, estudas, e um dia arranjas um emprego decente. É assim que sobrevivemos.” O pai pouco disse, mas o olhar dele—cansado e gasto—era igual. Não eram maus. Estavam assustados. Já tinham visto demasiados sonhos levarem a lado nenhum.
Mas o Rui tomou uma decisão. Não discutiu, não pediu. Apenas passou a acordar mais cedo. Continuou a correr depois do trabalho, depois do jantar, até tarde. Corria sob os candeeiros da rua, por becos e campos de escolas vazios—o seu fôlego cortante no ar frio. Manteve as notas altas, fez as tarefas e, mesmo assim, encaixou os treinos no meio de tudo, porque no fundo queria mais—não só para si, mas para a família.
O Sr. Almeida viu tudo. Nunca o pressionou. Apenas ficava à beira da pista com o seu cronómetro e um olhar de fé silenciosa. E quando as inscrições para a maior maratona do país abriram, o Sr. Almeida pagou a taxa do seu bolso e inscreveu o Rui.
“Não tens de ganhar,” disse. “Mas acho que devias correr com quem acredita que consegue.”
O Rui olhou para o formulário—o seu nome abaixo de miúdos de escolas privadas e academias de elite—e assentiu. “Vou.” Não sabia o que viria a seguir. Apenas sabia que, acontecesse o que acontecesse, não ia parar de correr.
Nas semanas que se seguiram, o Rui correu como se o mundo estivesse a ver—mesmo que, no início, ninguém estivesse. Todas as noites, depois de arrumar caixas no supermercado da esquina, encontrava-se com o Sr. Almeida na velha pista atrás da escola. Não havia holofotes, nem multidões—apenas o som de ténis no cascalho, o fôlego constante do Rui e o Sr. Almeida a marcar os tempos com o mesmo cronómetro desgastado.
“Estás mais rápido,” dizia o velho. “Mas não é só velocidade; é coração. É isso que faz grandes corredores.”
Na escola, nem todos viam assim. Alguns colegas começaram a reparar nos treinos do Rui e tinham muito a dizer.
“Olha quem quer ser herói,” troçou um, olhando para os ténis remendados do Rui. “O que é a seguir? As Olimpíadas?”
Outro riu-se. “Espero que o prémio chegue para atacadores novos.”
O pior veio do Tomás Ventura, um miúdo da parte rica da cidade—alto, convencido, de sorriso afiado. O pai era autarca, e o Tomás nunca deixava ninguém esquecer. Já tinha saído no jornal local como o futuro do atletismo escolar. Quando soube que o Rui ia correr a maratona, riu-se alto o suficiente para metade do corredor ouvir.
“Espero que não tropeces nesses sapatos de lixo, rapaz,” disse. “Isto não é uma corrida de caridade.”
O Rui não respondeu. Não tinha tempo a perder com barulho, mas ainda doeu. Mesmo o Sr. Almeida enfrentou murmúrios na sala dos professores.
“Estás a dar falsas esperanças a este miúdo,” disse um treinador. “Fazê-lo achar que pode competir com atletas de academias. Isso não é incentivo; é crueldade.”
Mas o Sr. Almeida não cedeu. “A diferença entre esperança e crueldade,” respondeu, “é saber se alguém está disposto a trabalhar por ela.”
Mesmo assim, as coisas não eram fáceis em casa. A maratona aproximava-se, e os turnos do Rui estavam cada vez mais longos. A mãe aceitou um segundo emprego a limpar um motel à beE assim, com os mesmos ténis que tinham corrido por tanto mais do que uma linha de chegada, o Rui seguiu em frente, sabendo que a verdadeira vitória nunca tinha sido sobre quem chegava primeiro, mas sobre quem nunca deixava de ajudar os outros a chegarem também.