A música tocava alto, as risadas ecoavam em volta da piscina no terraço, e o aroma do champanhe caro flutuava no ar. Era uma daquelas festas extravagantes onde os ricos se reuniam para exibir seu dinheiro, seus contatos e suas vidas perfeitas. Entre vestidos brilhantes e ternos elegantes, Mariana Sousa se destacava —não por pertencer àquele lugar, mas justamente porque não pertencia.
Mariana era uma garçonete de 23 anos contratada apenas para aquela noite, encarregada de servir bebidas e petiscos. Com seu modesto uniforme preto e sapatos gastos, tentava passar despercebida, misturando-se ao fundo. Não estava acostumada a tanto luxo; sua vida girava em torno de turnos duplos em cafés, viagens noturnas de autocarro e de esticar cada euro para cuidar de sua mãe doente, que vivia em Alfama.
Mas naquela noite, o universo parecia decidido a humilhá-la.
Enquanto caminhava com cuidado, segurando uma bandeja de taças de champanhe, um grupo de jovens socialites —vestidas com roupas de grife e saltos que custavam mais do que Mariana ganhava em um mês— bloqueou seu caminho. A líder, uma morena alta chamada Margarida Albuquerque, olhou para ela com o desprezo natural de quem nascera entre privilégios.
“Olha por onde andas, criada,” disse Margarida em voz alta, suficiente para que todos ouvissem. Algumas pessoas riram. Mariana corou, murmurou um pedido de desculpas e tentou afastar-se, mas Margarida não havia acabado.
“Na verdade, porque não te refrescas um pouco?” acrescentou com um sorriso malicioso.
Antes que Mariana pudesse reagir, Margarida empurrou seu ombro. A bandeja voou, as taças quebraram-se no chão, e Mariana caiu de costas na água com um grande chapão.
Houve gritos de surpresa… seguidos de gargalhadas. Telemóveis ergueram-se, câmaras piscaram, e vozes zombeteiras encheram o ar enquanto Mariana lutava para emergir. Seu uniforme ensopado colava-se ao corpo, seus sapatos pesavam como pedras, e cada movimento para alcançar a borda era uma batalha.
“Estás bem melhor molhada!” gritou alguém.
“Ó rapariga, talvez devas nadar por gorjetas!” zombou outro.
As lágrimas queimavam nos olhos de Mariana, mas ela manteve a cabeça baixa, tentando sair da piscina sem se desfazer em pranto. Queria desaparecer, dissolver-se na água e nunca mais ver a crueldade naqueles olhares.
E então, no meio do tumulto, algo mudou.
As risadas calaram-se subitamente, como se alguém tivesse apagado a luz. O som de sapatos de couro caro ecoou no piso. Todos os olhares viraram-se para a entrada, onde um homem alto, vestindo um fato azul-marinho, acabara de chegar. Sua mera presença impunha silêncio —não apenas por sua aparência, embora fosse impressionante, mas porque todos sabiam exatamente quem ele era.
Era António Mendes, o milionário que construíra seu império do nada, dono de metade dos empreendimentos imobiliários da cidade. Ao contrário dos convidados mimados, ele escalara da pobreza ao poder, e sua reputação precedia-o. Parou, fitando Mariana, encharcada e trémula à beira da piscina.
E então António fez algo que ninguém esperava.
Os convidados aguardaram, prendendo a respiração, pensando que ele repreenderia a garçonete desajeitada por arruinar sua chegada. Mas ele fez o impensável.
Tirou seu relógio caro —que valia mais do que o aluguel anual de Mariana— e colocou-o cuidadosamente sobre uma mesa. Sem dizer uma palavra, aproximou-se e estendeu-lhe a mão.
Mariana ficou paralisada, com a água escorrendo do cabelo até os olhos, demasiado surpresa para reagir.
“Vamos,” disse ele com voz firme mas calma. “Não pertences ao chão.”
Hesitante, Mariana agarrou sua mão. Seu aperto era firme, estável, tirando-a da água como se a resgatasse não apenas da piscina, mas da própria humilhação. A multidão observou, incrédula, enquanto António tirava o casaco e o colocava sobre seus ombros, protegendo-a do frio e dos olhares.
“Quem fez isto?” Seu tom cortante varreu a multidão.
Ninguém respondeu, mas o riso nervoso de Margarida a denunciou.
O olhar de António atravessou-a como uma espada.
“Menina Albuquerque,” disse com frieza. “A empresa de seu pai acabou de perder um contrato muito lucrativo com a minha. Não trabalho com gente que cria filhos sem decência.”
O sorriso de Margarida desmoronou. Houve murmúrios de choque, e ela tentou defender-se, mas António já lhe virara as costas.
O milionário voltou-se para Mariana, sua expressão suavizada.
“Estás magoada?” perguntou baixinho.
Mariana abanou a cabeça, embora sentisse o peito dolorido por dentro. “E-estou bem,” sussurrou.
“Não estás,” replicou ele. “Mas estarás.”
GuE, assim, entre o murmúrio da cidade e o silêncio da noite que os envolveu, Mariana compreendeu que a vida, por mais dura que fosse, às vezes reservava surpresas vindas da mão de quem já conhecera a mesma dor.