Grávidas dão azar a carros novos! Saiam daqui!” gritou o homem, batendo a porta do carrão preto.

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A esposa, Beatriz Costa, grávida de seis meses, ficou parada à beira da estrada. As mãos tremiam enquanto segurava a barriga, os olhos arregalados de incredulidade.

Era para ser uma noite feliz. Tiago tinha acabado de buscar o carro de luxo na concessionária no centro do Porto. Beatriz sorrira o dia todo, animada para a primeira viagem com o marido. Imaginava os dois rindo, conversando sobre nomes para o bebê e sonhando com a futura família.

Mas esse sonho desmoronou no momento em que Tiago parou o carro bruscamente numa rua tranquila do subúrbio.

— Saia! — rosnou.
Beatriz piscou, achando que era brincadeira. — Tiago… o que estás a dizer? Está escuro aqui. Eu não—
— Estou falando sério! — cortou ele, o tom cortante. — Vais estragar a sorte do meu carro novo. Não devias ter vindo.

Desapertou-lhe o cinto e quase a empurrou para fora do carro. Beatriz tropeçou, mal conseguindo manter o equilíbrio. A porta bateu com força, e Tiago acelerou, os faróis vermelhos desaparecendo na noite.

Por alguns segundos, Beatriz ficou imóvel sob o candeeiro da rua. Depois, a realidade atingiu-a como uma onda. Ele realmente a abandonara. O marido — o homem que um dia ajoelhara para beijar sua barriga e sussurrar promessas de amor eterno — deixara-a na estrada por causa de uma superstição.

O vento estava frio. Envolveu os braços em torno de si, sentindo humilhação e dor. Uma cãibra aguda apertou-lhe a barriga, e o pânico invadiu-lhe as veias. — Por favor, não agora — sussurrou. — Por favor, bebé, fica calmo.

Um carro parou perto dela. O vidro baixou, revelando uma senhora de meia-idade com olhos bondosos. — Querida, estás bem? Precisas de ajuda?

Beatriz hesitou, mas a preocupação na voz da mulher quebrou seu orgulho. — Sim… por favor — murmurou.

A mulher, Isabel Soares, ajudou-a a entrar no carro e ofereceu-lhe água. Durante a viagem silenciosa, o telemóvel de Beatriz vibrou. Era Tiago.

— Não chores. Vais superar isso.
— Já te disse, não quero que estragues o meu carro novo.
— Para de ser dramática.

Cada mensagem foi como uma facada no coração.

Isabel notou as lágrimas silenciosas de Beatriz e disse, suavemente: — Querida, um homem que te trata assim não merece ser pai. Tu e o teu bebé merecem paz.

Naquela noite, Beatriz sentou-se no sofá do pequeno apartamento, olhando para a parede. Percebeu a verdade que ignorara por muito tempo: a arrogância de Tiago não era nova — apenas mostrava seu verdadeiro rosto.

E, ao colocar a mão sobre a barriga, sussurrou: — Não vou deixar que cresças perto desta crueldade.

Na manhã seguinte, Tiago agiu como se nada tivesse acontecido. Assobiava na cozinha enquanto via avaliações de carros no telemóvel. — Devias ter visto as caras na concessionária — disse, orgulhoso. — Todos olharam quando saí. Aquele carro é um monstro.

Beatriz permaneceu à mesa, pálida e calada, mexendo o chá. Os olhos estavam inchados de tanto chorar, mas Tiago não notou — ou não quis notar.

— Por que estás amuada? — perguntou. — Já te disse para não exagerares. Andas muito emotiva. Sê grata por eu te sustentar.

Beatriz não respondeu. Mas, por dentro, o coração endureceu. Percebeu que não havia mais gentileza naquele homem. Apenas ego.

Naquela tarde, quando Tiago saiu para o trabalho, ligou ao irmão, João Ferreira. João nunca gostara de Tiago; desde o início, vira a sua arrogância. Quando Beatriz contou o que acontecera, houve silêncio do outro lado da linha.

Finalmente, João disse: — Faz as malas. Vens para cá. Não vou deixar que esse homem te trate assim.

As mãos de Beatriz tremiam enquanto arrumava as roupas. Cada pontapé do bebé lembrava-lhe porque tinha de ser forte. Olhou em volta do apartamento — cada foto, cada recordação — e percebeu que já não pertencia ali.

Antes de sair, deixou um bilhete na cozinha:

— Escolheste o carro em vez da família. Não vou deixar que escolhas também pelo meu filho. — Beatriz.

Quando Tiago chegou a casa e viu o armário vazio, explodiu. Ligou-lhe repetidamente, deixou mensagens furiosas e até andou pela cidade à procura dela. Mas Beatriz não respondeu.

Na casa do irmão, rodeada de carinho, Beatriz sentiu-se segura pela primeira vez em meses. Dormiu em paz.

Os dias viraram semanas. Concentrou-se na gravidez, juntou-se a aulas pré-natais online e até falou com um advogado sobre o divórcio. Tiago, entretanto, estava a desmoronar. Os colegas descobriram o que ele fizera — João assegurou-se disso. Os murmúrios seguiam-no por todo lado.

O homem que só se importava com aparências agora via-se humilhado publicamente. Pela primeira vez, Tiago começou a arrepender-se das suas escolhas.

Dois meses depois, numa fresca manhã de primavera, Beatriz entrou em trabalho de parto. João levou-a rapidamente para o hospital, segurando-lhe a mão enquanto ela suportava a dor. Horas depois, os gritos transformaram-se em risos quando a enfermeira colocou uma menina pequenina em seus braços.

— Bem-vinda ao mundo, Matilde — sussurrou, lágrimas de alegria escorrendo pelo rosto.

Tiago soube do nascimento por um amigo em comum. Sem hesitar, foi diretamente para o hospital. O traje outrora impecável estava amarrotado, os olhos cansados. Pela primeira vez, o homem orgulhoso parecia pequeno.

Ao entrar no quarto, congelou. Beatriz estava sentada, sorrindo para Matilde, com João ao lado, protetor. As enfermeiras ignoraram-no.

— Vim… ver a minha filha — disse, baixinho.

Beatriz ergueu o olhar. A expressão era calma, mas distante. — A nossa filha não precisa de um pai que expulsa a mãe de um carro — afirmou, firme. — Perdeste esse privilégio no momento em que escolheste o teu ego em vez da tua família.

A voz de Tiago quebrou. — Beatriz, por favor. Errei. Fui estúpido. Vou mudar.

Mas ela abanou a cabeça. — A Matilde merece mais. Devias pensar no tipo de homem que queres ser — mas eu não vou esperar mais por ti.

Tiago saiu do hospital em silêncio. Sentou-se no seu Mercedes, os bancos de couro frios e sem vida. Pela primeira vez, sentiu apenas vazio. O carro que antes simbolizava sucesso tornara-se um monumento ao seu fracasso.

Entretanto, Beatriz floresceu. Mudou-se para uma casa acolhedora, arranjou trabalho remoto e cercou-se de quem realmente se importava. Matilde cresceu saudável e feliz, o riso enchendo a casa de luz.

Tiago às vezes via-as à distância — Beatriz a levar Matilde ao parque, rindo sob o sol. Cada vez, sentia a dor do que perdera.

Trocara o amor pela vaidade, a família pelo orgulho — e agora, não tinha nenhum dos dois.

E Beatriz? Nunca olhou para trás.

Afinal, as melhores estradas são aquelas que nos afastam de quem não merece a nossa companhia.

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