O palácio dos Almeidas brilhava com lustres de cristal e taças reluzentes naquela noite. O ar estava impregnado de perfume, riqueza e sorrisos falsos. A festa celebrava a promoção de Tiago Almeida a diretor regional da sua empresa. Os convidados enchiam a sala de jantar, rindo e saboreando champanhe — mas por trás da alegria polida, fervia uma tensão silenciosa.
À cabeceira da mesa estava Margarida Almeida, sessenta e três anos, elegante, calculista e fria. Durante anos, governara a família como um negócio — controle e reputação acima de tudo. Do outro lado, sentava-se Beatriz, sua nora — grávida de oito meses, radiante e doce. Vestira um longo vestido creme que abraçava sua barriga redonda, com uma mão sempre repousada sobre ela, como quem protege um segredo.
Margarida nunca aceitara Beatriz. “Uma rapariga de uma terra pequena não tem lugar numa família como a nossa,” costumava dizer. Mesmo naquela noite, enquanto forçava um sorriso, seus olhos brilhavam com desdém.
“Beatriz, querida,” disse Margarida durante o brinde, a voz melífera, “estás tão… saudável. Deves estar a comer bem. O meu filho mima-te, não é?”
Risadas ecoaram pela mesa. Beatriz sorriu sem jeito. Tiago lançou à mãe um olhar de advertência.
“Mãe, por favor,” resmungou.
“Oh, vá lá,” Margarida respondeu leve. “Foi só uma piada.”
Mas as suas “piadas” não pararam. Durante o jantar, continuou a alfinetar, a zombar das origens de Beatriz, do vestido, do seu silêncio. Os convidados mexiam-se, incómodos. Beatriz manteve-se serena, a mão sobre a barriga, sussurrando à filha que ainda não nascera: *Está tudo bem. Respira.*
Quando o prato principal chegou, Beatriz levantou-se para ajudar o empregado com a bandeja — um gesto simples, gentil. Ao voltar para se sentar, a mão de Margarida estendeu-se e puxou a cadeira para trás.
Aconteceu num instante.
O som áspero da madeira a arrastar, o baque surdo do corpo contra o mármore — e depois o grito de Beatriz:
“Ai—o meu bebé!”
O salão inteiro congelou. Copos tombaram, talheres caíram. A cadeira de Tiago raspou no chão enquanto ele corria para ela. “Beatriz!”, gritou, ajoelhando-se ao seu lado. Manchas de sangue tingiam a bainha do vestido. O pânico transparecia nos olhos arregalados dela.
O rosto de Margarida empalideceu. “Eu—eu não quis—”, gaguejou, mas todos tinham visto o sorriso que precedera o acto.
“Chamem uma ambulância!”, rugiu Tiago, a voz a quebrar.
Os convidados permaneceram estáticos, horrorizados, enquanto Beatriz agarrava a barriga e soluçava.
“O meu bebé… por favor…”
Em minutos, os paramédicos irromperam pelas portas. O jantar opulento foi esquecido. Vinho derramado, risadas extintas, e a orgulhosa matriarca dos Almeidas ficou a tremer enquanto a nora grávida era levada numa maca.
Foi então que Margarida percebeu — talvez tivesse destruído justamente o que o filho mais amava.
O hospital cheirava a antisséptico e medo. Durante horas, Tiago percorreu o corredor, a camisa manchada de sangue. Margarida sentou-se num banco, as mãos trêmulas, fixas no chão branco.
Quando o médico enfim apareceu, o semblante estava grave.
“Ela e o bebé estão estáveis — por agora,” disse baixinho. “Mas a queda foi violenta. Precisa de repouso. Se fosse alguns centímetros diferente…” Não terminou a frase.
Tiago exalou, aliviado. “Graças a Deus.” Depois, a voz tornou-se gélida. “Não me agradeças, Mãe. Agradece aos que a salvaram. Por tua culpa, quase as perdi.”
Os lábios de Margarida tremeram. “Tiago, eu não—”
“Tiraste a cadeira,” ele interrompeu. “Todos viram.”
“Foi uma brincadeira, não pensei—”
“Esse é o problema. Nunca pensas em ninguém além de ti.”
Virou-lhe as costas e entrou no quarto de Beatriz.
Lá dentro, ela estava pálida mas consciente, tubos ligados ao pulso. A mão repousava sobre o ventre. Tiago pegou nela e sussurrou: “Estão seguras. As duas.”
Lágrimas escorreram pelo rosto de Beatriz. “Por que me odeia tanto, Tiago?”
Ele não respondeu. O silêncio dizia tudo.
Nos dias seguintes, a história espalhou-se. Alguém vazara uma foto do jantar — o exato momento da queda, o rosto aterrorizado de Beatriz capturado. A internet tornou-se implacável. Manchetes gritavam:
“Socialite humilha nora grávida — quase provoca aborto.”
O nome Almeida — antes símbolo de prestígio — virou sinónimo de escândalo. Tiago recusou-se a falar com a mãe. Convidados que outrora adulavam Margarida agora evitavam-na.
Enquanto isso, Beatriz recuperava aos poucos, o coração da menina batendo forte outra vez. Mas a confiança estava partida.
Numa noite, Margarida parou à porta do quarto, ouvindo o bip monótono dos aparelhos. Queria pedir perdão — mas o orgulho a paralMas quando viu, pela primeira vez, os pequenos dedos da neta agarrarem seu próprio dedo com uma força surpreendente, percebeu que o amor, afinal, era maior do que qualquer orgulho.