Arrancaram-me a roupa à frente de todos, chamando-me interesseira, que não merecia o filho deles. A minha sogra ria-se enquanto eu estava ali, humilhada e destruída. Mas o que não sabiam era que o meu pai estava a ver tudo e estava prestes a mostrar-lhes quem eu realmente era. O meu nome é Leonor e esta é a história de como aprendi que, por vezes, as pessoas que deviam proteger-nos são as que mais nos magoam.
E por vezes a justiça chega de formas que nunca esperámos. Eu era apenas uma rapariga simples de uma aldeia pequena quando conheci o Diogo. Ambos estávamos na universidade a estudar Gestão. Era encantador, bondoso e fazia-me rir como ninguém. Apaixonei-me por ele rápida e profundamente. Em um ano, casámo-nos numa cerimónia íntima. Era perfeito, ou assim pensei. O Diogo vinha de dinheiro. A família Monteiro era da alta sociedade, do tipo que vem com expectativas e preconceitos, mas isso não me importava.
Amava o Diogo por quem ele era, não pelo que tinha. O que a família dele não sabia, o que o Diogo não sabia, era que eu também vinha de dinheiro. Dinheiro verdadeiro, do tipo que faz os Monteiro parecerem amadores. O meu pai, António Ferreira, é um bilionário self-made. Construiu um império do zero e eu cresci num mundo de jets privados e possibilidades infinitas, mas vi como as pessoas tratavam o meu pai, como sorriam na sua cara enquanto calculavam o que podiam tirar dele.
Vi como cada amizade, cada relação vinha com um preço. Por isso, quando fiz 18 anos, tomei uma decisão. Mudei o meu apellido, mudei-me para longe e vivi com simplicidade. Queria encontrar um amor verdadeiro, um amor que não tivesse nada a ver com contas bancárias. O meu pai compreendeu. Sempre respeitou as minhas decisões, mesmo quando o preocupavam. Mas fez-me prometer uma coisa: se algum dia precisasse verdadeiramente dele, ligaria-lhe. E eu prometi.
Durante dois anos mantive essa promessa, determinada a fazer o meu casamento funcionar nos meus termos. A família do Diogo tornou isso quase impossível desde o primeiro dia. A mãe dele, Vera, olhava para mim como se eu fosse algo que tirara da sola do sapato. Nunca perdia uma oportunidade para me lembrar que eu não pertencia ali, que não era boa o suficiente para o seu filho. Servia-lhes chá às amigas. Apresentava-me como “a miúda com quem o Diogo se casou”, nunca pelo meu nome.
Criticava a minha roupa, o meu cabelo, a forma como falava. Nada do que fazia estava certo. O pai dele, Rui, simplesmente ignorava-me. Podia entrar numa sala e ele olhava através de mim como se fosse invisível. Talvez isso fosse pior do que a crueldade aberta da Vera. Pelo menos ela reconhecia a minha existência, ainda que fosse só para me magoar. E depois havia a Carolina, a irmã mais nova do Diogo. Era talvez a pior de todas, porque sorria enquanto me apunhalava pelas costas.
Elogiava o meu vestido e depois sussurrava às amigas que parecia barato. Convidava-me para almoçar e passava o tempo a falar de como o Diogo podia ter casado com qualquer uma, quantas raparigas bonitas e ricas o tinham desejado. A mensagem era clara: eu tinha sorte por estar ali e devia agradecer por me tolerarem. Mas tentei. Deus sabe que tentei. Pensei que, se fosse paciente, se fosse bondosa, eventualmente veriam quem eu realmente era. Pensei que o amor seria suficiente.
O Diogo dizia-me para não me preocupar, que a família dele mudaria, mas nunca me defendeu. Apenas me pedia para me esforçar mais, para entender que eles eram assim. Dois anos passaram assim, engolindo o meu orgulho, aceitando desrespeito, fingindo que estava tudo bem. E então chegou o nosso segundo aniversário. A Vera insistiu em fazer-nos uma festa. Não para nós, claro, mas para ela, para se exibir perante as amigas da alta sociedade, para provar que o filho tinha uma vida perfeita, mesmo que a mulher fosse, nas suas palavras, “uma desgraça”.
Quis dizer que não, mas o Diogo convenceu-me. “Talvez seja a forma deles te aceitarem”, disse. Devia ter sabido melhor. A festa era na Quinta dos Monteiros e a Vera não poupou despesas. Quando cheguei, não acreditava no que via. Lustres de cristal pendurados por todo o lado, cada um valendo mais do que a casa de muita gente. Uma orquestra ao vivo tocava num canto. Fontes de champanhe jorravam garrafas caríssimas que eu nem saberia pronunciar.
Esculturas de gelo, flores importadas, uma passadeira vermelha com fotógrafos à entrada. Mais de 200 convidados, todos magnatas, celebridades, políticos — quem importava na alta sociedade. Mulheres cobertas de diamantes e vestidos de marca, homens com fatos à medida e relógios que pagariam uma faculdade. Carros de luxo alinhados na entrada, motoristas de fato. E eu, com o meu vestido simples de cor creme, comprado em saldo. Sentia-me uma tola.
A Vera encontrou-me em minutos, o sorriso dela afiado como vidro. “Oh, Leonor, vieste! Que… pitoresca”, disse. A Carolina riu-se ao lado dela, radiante num vestido prateado que custava mais do que eu gastara em roupa num ano. “Estamos tão felizes por teres vindo à tua própria festa”, disse, docemente. O insulto disfarçado de gentileza. O Diogo foi logo puxado pelo pai para falar de negócios com homens importantes. Fiquei sozinha, tentando passar despercebida, a contar as horas até aquela tortura acabar.
Não sabia que ia piorar. A festa estava no auge quando aconteceu. A orquestra parou e a Vera pegou no microfone para um brinde. Agradecia aos convidados, falava de família e amor — a ironia quase fez-me rir. Depois, a expressão dela mudou. A mão voou ao pescoço. “O meu colar! O meu colar de diamantes rosa! Desapareceu!” A sala ficou em silêncio. Todos os olhos voltaram-se para ela. “Alguém roubou o meu colar. Vale dois milhões e estava aqui há uma hora.”
O meu estômago embrulhou-se. Sabia o que vinha a seguir. Via-o nos olhos dela quando se fixaram em mim. “Leonor”, disse, como uma acusação. “Estiveste no meu quarto mais cedo. Eu vi-te.” Duzentos pares de olhos viraram-se para mim. “Eu só estava à procura da casa de banho”, gaguejei. “Não peguei em nada, juro!” “Ela está a mentir”, cortou a Carolina. “Eu também a vi. Andava perto do porta-joias.” “Isto é ridículo”, disse eu, a voz a tremer.
A Vera sorriu, fria. “Todos sabem que te casaste com o meu filho por dinheiro. Agora roubas-nos? És mesmo o que pensámos.” A sala encheu-se de murmúrios. Telemóveis a gravar. Procurei o Diogo, desesperada. Ele estava com o pai. “Diogo, por favor, diz-lhes que eu não faria isto!” Ele olhou para mim, hesitou, e depois olhou para os pais e para a multidão. Não disse nada. “Revistem-na já”, ordenou o Rui. “Se é inocente, não tem nada a esconder.”
A Vera e a Carolina avançaram como predadoras. Tentei recuar, mas estava encurralada. Duzentas pessoas formaram um círculo, telemóveis a gravar. A Vera agarrou o meu braço, as unhas a enterrarem-se na minha pele. “Se não cooperas, fazemos isto à força.” Lutei, mas eram duas contra uma. A Carolina puxou o fecho do meuE foi ali, naquela noite de humilhação, que percebi que a verdadeira riqueza nunca esteve no dinheiro, mas na coragem de ser quem realmente sou.