Leonor Valente parava à porta da sua casa modesta, a mala encostada à parede como uma arma que já tinha escolhido. O vestido carmesim que vestia era reservado para encontros com homens que pudessem oferecer-lhe a vida que tanto desejava—riqueza, luxo e emoção. O marido, Tiago, ajoelhava-se diante dela, o rosto marcado pelo desespero. Passara mais um dia cruel no mercado municipal, as roupas manchadas e o corpo exausto de tanto trabalhar.
“As Mariana e Leonor precisam de ti,” suplicou, a voz a tremer. As gémeas, mal com um ano de vida, sentiram a tensão, as mãozinhas a estenderem-se para a mãe. Mas os olhos de Leonor estavam fixos no carro negro e reluzente que esperava lá fora, os faróis a iluminarem um caminho para um mundo diferente.
Com um último olhar para o marido e as filhas, Leonor virou costas, o som dos seus saltos a ecoar no silêncio pesado. A porta do carro bateu, marcando o fim de uma família e o início da sua busca por uma vida de luxo. Enquanto Tiago abraçava as filhas, prometeu-lhes: “Mesmo que ela nos deixe, o vosso Pai nunca vos abandonará.”
Os dias viraram semanas, e Tiago trabalhou sem descanso, empurrando carrinhos cheios de mercadorias pelo mercado agitado. O peso das responsabilidades era grande, mas o riso de Mariana e Leonor dava-lhe forças. Sussurrava promessas enquanto elas dormiam, jurando que nunca conheceriam a vergonha do abandono.
Com os anos, os sacrifícios de Tiago começaram a dar frutos. Inscreveu as gémeas numa escola pública, os uniformes usados mas bem passados pelas suas mãos cuidadosas. Apesar dos murmúrios e das gozações dos outros pais, enchia-se de orgulho ao vê-las entrar no mundo da educação. Mariana destacava-se em matemática, enquanto Leonor brilhava em ciências. Todos os dias, Tiago esperava por elas à porta da escola, o coração a saltar quando corriam para os seus braços.
Mas o estigma do passado persistia. Tiago aguentou os insultos no mercado em silêncio, pois cada palavra era uma prova da sua resistência. As gémeas ouviam as provocações, e a sua determinação só crescia. Prometeram a si mesmas que iriam subir tão alto que a mãe se arrependeria de as ter deixado.
No seu 16.º aniversário, Mariana e Leonor enfrentaram o pai, os olhos cheios de convicção. “Vamos subir até a mãe se arrepender de nos ter abandonado,” prometeram. Tiago chorou em silêncio, abraçando-as e murmurando bênçãos sobre as suas cabeças.
O dia da formatura chegou, uma celebração do seu esforço. Quando receberam os prémios por mérito académico, Tiago gritou de alegria, o seu orgulho a encher o salão. Os aplausos eram ensurdecedores, mas eram os sorrisos das filhas que aqueciam o seu coração.
Na idade adulta, o sucesso acompanhou as gémeas. Mariana lançou um pequeno negócio, enquanto as inovações científicas de Leonor chamaram a atenção. Trabalharam sem parar, muitas vezes até de madrugada, movidas pelo desejo de mudar a vida do pai.
O esforço valeu-se quando receberam bolsas de estudo para universidades prestigiadas. Tiago chorou ao segurar as cartas de aceitação, sabendo que cada ferida e cada sacrifício tinham valido a pena. As suas filhas não subiam—voavam.
Anos depois, já líderes nos seus campos, a família Valente transformara-se. A casa humilde tornara-se uma mansão, e Tiago descansava numa poltrona de veludo, rodeado pelo riso das filhas, que tinham tornado os sonhos em realidade.
Foi então que Leonor regressou. Depois de abandonar a família pela riqueza de outro homem, estava agora aos portões da mansão, a voz a quebrar enquanto chamava pelas filhas. Os seguranças hesitaram. Dentro de casa, Tiago sentiu uma tempestade dentro de si. A mulher que os deixaraOs seguranças fecharam os portões lentamente, e o som do ferrolho a cerrar ecoou como um ponto final na história que Leonor nunca mais poderia reescrever.