Rasgaram-me a roupa na frente de todos, chamando-me caçadora de fortunas, que não merecia o filho deles. A minha sogra ria-se enquanto eu ficava ali parada, humilhada e destruída. Mas o que não sabiam era que o meu pai estava a ver tudo e estava prestes a mostrar-lhes quem eu realmente era. Chamo-me Inês e esta é a história de como aprendi que, por vezes, as pessoas que deviam proteger-nos são as que mais nos magoam.
E, por vezes, a justiça chega de formas que nunca esperámos. Eu era apenas uma rapariga simples de uma vila pequena quando conheci o Pedro. Ambos estávamos na universidade a estudar gestão. Ele era encantador, gentil e fazia-me rir como ninguém. Apaixonei-me por ele rapidamente. Em um ano, casámos numa cerimónia íntima. Era perfeito, ou assim pensei. O Pedro vinha de dinheiro. A família Albuquerque era riqueza antiga, do tipo que vem com expectativas e julgamentos, mas isso não me importava.
Amava o Pedro por quem ele era, não pelo que tinha. O que a família dele não sabia, o que o Pedro não sabia, era que eu também vinha de dinheiro. Dinheiro a sério, do tipo que faz os Albuquerque parecerem amadores. O meu pai, António Silva, é um bilionário que construiu o seu império do zero. Cresci num mundo de jatos privados e possibilidades infinitas, mas vi como as pessoas tratavam o meu pai, como sorriam na sua cara enquanto calculavam o que poderiam ganhar dele.
Vi como cada amizade, cada relação, vinha com uma etiqueta de preço. Por isso, quando fiz 18 anos, tomei uma decisão. Mudei o meu apellido, mudei-me para longe e vivi modestamente. Queria encontrar um amor verdadeiro, um amor que não tivesse nada a ver com contas bancárias. O meu pai compreendeu. Respeitou as minhas decisões, mesmo quando o preocupavam. Mas fez-me prometer uma coisa: se um dia precisasse mesmo dele, ligaria-lhe. Prometi.
Durante dois anos, mantive essa promessa, determinada a fazer o meu casamento funcionar nos meus termos. A família do Pedro tornou isso quase impossível desde o primeiro dia. A mãe dele, Beatriz, olhava para mim como se eu fosse algo que tirara da sola do seu sapato de marca. Nunca perdia uma oportunidade para me lembrar que eu não pertencia àquele mundo, que não era boa o suficiente para o filho dela. Servia-lhe chá às amigas. Apresentava-me como “a rapariga com quem o Pedro casou”, nunca pelo meu nome.
Criticava a minha roupa, o meu cabelo, a forma como falava. Nada do que eu fazia estava certo. O pai do Pedro, Rui, simplesmente ignorava-me. Podia entrar numa sala e ele olhava através de mim como se fosse invisível. Talvez isso fosse pior do que a crueldade activa de Beatriz. Pelo menos ela reconhecia a minha existência, mesmo que fosse só para me magoar. E depois havia a Sofia, a irmã mais nova do Pedro. Era talvez a pior de todas, porque sorria enquanto me esfaqueava pelas costas.
Elogiava o meu vestido, depois sussurrava às amigas que parecia barato. Convidava-me para almoçar, só para passar o tempo a falar de como o Pedro poderia ter casado com qualquer uma, quantas raparigas bonitas e ricas o tinham desejado. A mensagem era clara: eu tinha sorte por estar ali e devia agradecer por sequer me tolerarem. Mas eu tentei. Deus sabe que tentei. Pensei que, se fosse paciente e amável o suficiente, um dia ver-me-iam por quem eu era. Pensei que o amor bastava.
O Pedro dizia-me para não me preocupar, que a família dele mudaria, mas nunca me defendeu. Apenas me pedia para me esforçar mais, para entender que eles eram assim. Dois anos passaram assim, engolindo o meu orgulho, aceitando desrespeitos, fingindo que estava tudo bem. E então chegou o nosso segundo aniversário. A Beatriz insistiu em fazer uma festa. Não para nós, claro, mas para ela, para mostrar às suas amigas da alta sociedade que o filho tinha uma vida perfeita, mesmo que a esposa fosse, nas suas palavras, “uma desgraçada”.
Queria dizer que não, mas o Pedro convenceu-me. “Talvez seja a forma deles te aceitarem”, disse. Devia ter sabido melhor. A festa foi na Quinta dos Albuquerque, e a Beatriz não poupou despesas. Quando cheguei naquela noite, não acreditava no que via. Lustres de cristal pendurados por todo o lado, cada um valendo mais do que a casa de muitas pessoas. Uma orquestra tocava música clássica. Champagne caro corria em fontes. Esculturas de gelo, flores importadas, uma passadeira vermelha com fotógrafos à espera.
Mais de 200 convidados, todos figuras importantes da sociedade. Mulheres com vestidos de marca e diamantes, homens com fatos feitos à medida e relógios que custavam uma fortuna. Carros de luxo alinhados à porta. E lá estava eu, com um vestido simples, comprado em saldo. Sentia-me uma tola. Via os olhares, ouvia os sussurros: “É ela. É com isso que o Pedro se contentou.” A Beatriz encontrou-me em minutos, o seu sorriso afiado como vidro. “Oh, Inês, vieste. Que… pitoresca.” A Sofia riu-se ao seu lado, radiante num vestido prateado que custava mais do que o meu guarda-roupa inteiro.
O Pedro foi imediatamente arrastado pelo pai para falar de negócios com homens importantes. Fiquei sozinha, tentando passar despercebida, contando as horas até aquela noite acabar. Mas não fazia ideia de que estava prestes a piorar. A festa estava no auge quando aconteceu. A orquestra parou de tocar, e a Beatriz pegou no microfone. Estava a agradecer aos convidados, a falar de família e amor—ironia das ironias. De repente, a expressão dela mudou. A mão voou para o pescoço. “O meu colar!” exclamou. “O meu colar de diamantes rosa desapareceu!”
A sala ficou em silêncio. Todos os olhos voltaram-se para ela—e depois para mim. “Inês”, disse, acusadora. “Tu estiveste no meu quarto mais cedo. Eu vi-te.” “Eu só estava à procura da casa de banho”, gaguejei. “Não levei nada. Juro.” “Ela está a mentir”, interrompeu a Sofia. “Eu também a vi. Estava mesmo junto ao porta-joias da mãe.” Sentia-me a afogar. A Beatriz olhou para mim com desdém. “Por que haverias de roubar-nos? Todos sabem que te casaste com o meu filho por dinheiro. Este colar só prova o que és: uma ladra.”
A sala encheu-se de murmúrios. Telemóveis surgiram, todos a filmar. Olhei para o Pedro, desesperada. Ele olhou para mim, depois para a mãe, para o pai—e não disse nada. O Rui avançou. “Revista-a agora mesmo. Se é inocente, não tem nada a esconder.” Não estavam a falar a sério. Mas estavam. A Beatriz e a Sofia aproximaram-se como predadoras. Tentei afastar-me, mas não havia para onde correr.
Arrancaram-me o vestido à força, na frente de todos. Gritei, tentei cobrir-me, mas já estava nua, só com a roupa interior, no meio daquela sala luxuosa. Duzentas pessoas a olhar, a filmar. A Beatriz revistou o meu vestido rasgado, anunciando que não encontrava nada. “Mas isso não prova nada. Tirem-na daqui”, ordenou o Rui. Os seguranças agarraram-me e arrastaram-me para fora.
O Pedro não fez nada. Virou as costas. Naquele momento, algo dentro de mim quebrou. Não foi a humilhação, nem as acusações falsas. FE foi ali, naquela noite fria, envolta apenas no casaco de um estranho, que percebi o verdadeiro poder da minha própria história e decidi nunca mais deixar que ninguém me definisse.