Chamo-me Leonor Matias, uma advogada empresarial de 36 anos a viver em Lisboa.
Na última década, acreditei que a minha vida girava em torno de duas certezas: estabilidade e segurança. Essa crença começou no dia em que casei com Ricardo Matias, um homem que pensei ser a minha âncora.
Ricardo, de 43 anos, era diretor regional numa farmacêutica — refinado, estratégico e impecavelmente composto. O tipo de homem que parecia estar sempre no controle. Conhecemo-nos num congresso no Porto.
Cada gesto dele parecia calculado, como se estivesse a ensaiar um espetáculo perfeito. Em menos de um ano, casámo-nos numa cerimónia íntima na Serra da Estrela. A luz do sol fazia o seu sorriso parecer uma promessa.
Durante anos, construímos o que parecia ser uma vida de sonho: uma casa em Cascais, dois golden retrievers, escapadelas de esqui na Serra da Nevada. Mas por baixo da superfície, as fissuras começaram a aparecer.
Há cerca de um ano, Ricardo começou a chegar tarde às quartas-feiras. Depois, outros dias se seguiram, cada um com desculpas plausíveis — jantares de trabalho, reuniões, lançamentos de produtos.
Não o questionei. Estava cansada. Confiava nele. Até que, uma noite, reparei numa camisa largada sobre uma cadeira, cheirando a uma colónia demasiado juvenil para ele.
“Estou a experimentar algo novo”, disse quando perguntei. Acenei, não comentei, mas a suspeita cravou-se no meu peito como um espinho.
O ponto de viragem veio numa mensagem da Beatriz, uma amiga da faculdade de Direito que agora trabalhava na empresa do Ricardo:
“Estava a jantar com ele… uma loira. Definitivamente não eras tu. Estavam demasiado próximos. Estás bem?”
O nome dela era Carolina Ventura, 28 anos, nova contratada do marketing e ex-modelo de fitness. Conheci-a uma vez numa festa de Natal. Educada, suave, quase perfeita demais. O elogio que me fez sobre o meu vestido nessa noite ecoava agora a fingimento.
Investiguei discretamente. O portátil do Ricardo revelou emails, convites na agenda e incontáveis reuniões com a Carolina.
Não o confrontei de imediato. Precisava de ver com os meus próprios olhos.
Numa quarta-feira, ele disse que estava em Faro. Em vez disso, vi-o entrar no Restaurante MiraRio com a Carolina, a mão pousada nas suas costas. O riso dela era suave, familiar. O sorriso dele? Já não era meu.
Três dias depois, sentei-me na nossa cama e disse com calma:
“Vi-te com a Carolina.”
Ele tentou negar, depois admitiu:
“Aconteceu.”
“Não”, respondi. “Escolheste que acontecesse.”
Naquele fim de semana, arrumei as coisas dele. Legalmente, a casa era nossa, mas fiquei eu. Ele não merecia ficar com o que traíra.
Seis semanas depois, Ricardo apareceu à minha porta, encharcado da chuva.
“A Carolina está grávida”, disse. “Onze semanas. É minha.”
Não senti nada — nem raiva, nem tristeza. Apenas silêncio.
“Porque vieste aqui?” perguntei. “Para parabéns?”
Ele não respondeu. Fechei a porta.
Semanas depois, durante o divórcio, cruzei-me com o Duarte Lourenço — amigo de faculdade do Ricardo e nosso antigo padrinho.
Puxou-me de lado.
“Acho que deves saber… Eu e a Carolina estávamos juntos antes de ela entrar na empresa do Ricardo. Acabou de repente, e eu acho… o bebé pode ser meu.”
Mostrou-me uma ecografia que a Carolina lhe enviara, com a legenda:
“A testa é toda tua.”
Havia mensagens — vagas, nervosas, flirtuosas — provando que ela não contara toda a verdade ao Ricardo.
O Duarte e eu concordámos que a verdade tinha de vir à tona. Não por vingança, mas pela criança.
Num jantar de celebração do bebé no Hotel Tivoli — ironicamente, o mesmo sítio onde comemorámos o nosso quinto aniversário — aparecemos sem convite.
Entreguei ao Ricardo uma pasta com provas: as mensagens da Carolina ao Duarte, a ecografia e notas de voz.
“Não pediste a verdade”, disse, “mas aqui está.”
A Carolina chamou falso. O Ricardo congelou. Depois, ouvimos uma gravação dela a dizer:
“O Ricardo não suspeita de nada. As coisas estão a correr melhor do que pensei.”
A sala ficou em silêncio. A Carolina explodiu:
“Tu eras o plano B, Duarte! Eu escolhi o Ricardo!”
“Acabaste de o admitir”, respondi, “em voz alta.”
O Ricardo ficou devastado. Mais tarde, confessou:
“Salvaste-me de uma mentira.”
Mas eu já tinha seguido em frente.
“Nem tudo precisa de ser consertado”, disse-lhe. “Algumas coisas precisam de ser largadas.”
Ele perguntou se eu conhecera alguém. Conhecera — o Francisco Almeida, um amigo da faculdade com quem reencontrei. Ele não veio para me consertar. Apenas ficou ao meu lado, com delicadeza.
O Duarte prometeu estar presente para a criança.
“Se a Lara for minha”, disse, “vou criá-la. Não preciso de teste nenhum.”
Três semanas depois do jantar, a Carolina deixou a cidade. O Duarte voou para o Algarve quando ela deu à luz.
Enviou-me uma foto de uma menina envolta num cobertor macio.
“Chama-se Lara”, lia-se na mensagem. “Tem o meu queixo.”
O Ricardo mudou-se para o Porto, tentando reconstruir-se. Escreveu-me um dia:
“Não é para te reconquistar. Apenas para me tornar um homem melhor.”
Não respondi — mas também não apaguei a mensagem.
A minha vida agora? Mais calma, mais devagar. Aos fins de semana, o Francisco e eu cozinhamos juntos. A filha dele pinta quadros na minha cozinha. O amor não é um espetáculo — é presença.
Não me arrependo de ter amado o Ricardo. Essa dor deu-me força. E a verdade, por mais brutal que fosse, levou-me à liberdade.