Noivo fez piada sobre mim em árabe na jantar em família — mas eu entendi tudo

6 min de leitura

O som das gargalhadas ecoava na sala privada do Restaurante Rosa de Lisboa, enquanto eu ficava perfeitamente imóvel, meu garfo pairando sobre o borrego intocado no prato. À volta da longa mesa, os 12 membros da família Sousa gesticulavam animadamente, o português fluindo como água sobre pedras, suave e constante, deliberadamente excluindo-me.

O meu noivo, Tiago, estava à cabeceira da mesa, a mão pousada de forma possessiva no meu ombro enquanto não traduzia absolutamente nada. A mãe dele, Leonor, observava-me com aqueles olhos de águia afiados, um sorriso ligeiro a brincar nos lábios. Ela sabia. Todos sabiam.

O lustre de cristal acima lançava sombras dançantes sobre a toalha branca quando Tiago se inclinou para o irmão mais novo, o Afonso, falando em português acelerado. As palavras fluíam facilmente, casualmente, como se eu não estivesse ali, como se eu não entendesse cada sílaba. “Ela nem sabe fazer um café decente,” disse Tiago, a voz carregada de diversão. “Ontem usou uma máquina. Uma máquina! Como se estivéssemos num restaurante qualquer.”

Afonso quase engasgou-se com o vinho. “E tu queres casar com esta? Meu irmão, o que aconteceu aos teus padrões?” Dei um gozo delicado na água, o rosto uma máscara cuidadosa de confusão educada. A mesma expressão que usara nos últimos seis meses, desde que Tiago me pedira em casamento. A mesma que aperfeiçoara durante os meus oito anos no Dubai, onde aprendera que, por vezes, a posição mais poderosa é aquela em que todos te subestimam.

A mão de Tiago apertou o meu ombro e ele virou-se para mim com aquele sorriso treinado, o que usava quando queria algo. “A minha mãe dizia que estás linda esta noite, meu amor.” Sorri de volta, suave e grata. “Que querido. Por favor, diz-lhe obrigada.” O que a mãe dele realmente dissera, há trinta segundos, foi que o meu vestido estava demasiado apertado e me fazia parecer barata. Mas acenei com apreço, desempenhando o meu papel perfeitamente.

Os empregados trouxeram mais uma travessa, pastéis delicados com mel e pistáchios. O pai de Tiago, Henrique, um homem distinto com fios prateados no cabelo escuro, ergueu a taça. “À família,” anunciou em inglês, uma das poucas frases que dirigira na minha língua a noite toda. “E a novos começos.” Todos ergueram os copos. Eu ergui o meu, encontrando os olhos dele através da mesa. Ele desviou o olhar primeiro.

“Novos começos,” murmurou a irmã de Tiago, a Inês, em português, alto o suficiente para a família ouvir. “Mais como novos problemas.”

“Ela nem fala a nossa língua, não sabe cozinhar a nossa comida, não sabe nada da nossa cultura. Que tipo de esposa será?” Tiago respondeu calmamente: “O tipo que não sabe quando está a ser insultada.” E a mesa explodiu em gargalhadas. Eu também ri. Um som pequeno e incerto, como se tentasse fazer parte de uma piada que não entendia. Dentro de mim, calculava, documentava, adicionando cada palavra à crescente lista de transgressões que compilava há meses.

O telemóvel vibrou na minha carteira. Pedi licença calmamente, levantando-me da mesa. “Casa de banho,” murmurei a Tiago. Ele acenou-me com desdém, virando-se de imediato para o primo, o Duarte, começando outra história em português. Ao afastar-me, ouvi-o claramente: “Ela é tão ansiosa por agradar que é quase patético. Mas a empresa do pai dela vai valer o incómodo.”

A casa de banho estava vazia, mármore e detalhes dourados, elegante e fria. Tranquei-me no cubículo mais afastado e puxei do telemóvel. A mensagem era do João Castro, chefe de segurança da empresa do meu pai, e uma das poucas pessoas que sabia o que eu realmente fazia. “Documentação carregada. Áudio dos últimos três jantares de família transcrito e traduzido. O teu pai quer saber se estás pronta para prosseguir.”

Escrevi rapidamente: “Ainda não. Preciso das gravações da reunião de negócios primeiro. Ele precisa de se incriminar profissionalmente, não só pessoalmente.” Três pontos apareceram, depois: “Entendido. A equipa de vigilância confirma que ele se encontra com os investidores angolanos amanhã. Teremos tudo.”

Apaguei a conversa, retoquei o lápis de lábios e estudei o meu reflexo. A mulher que olhava para mim já não era quem eu costumava ser. Há oito anos, eu era a Sofia Mendes, recém-saída da faculdade de economia, idealista e ingénua, a aceitar uma posição na empresa de consultoria internacional do meu pai em Lisboa. Achava que estava pronta para tudo. Não estava pronta para o que encontrei lá.

Lisboa fora uma revelação, não pelos arranha-céus reluzentes ou pelos carros de luxo, mas pela complexidade por baixo. Os negócios intrincados conduzidos em português sobre infinitos cafés, as regras não ditas de negociação, os nuances culturais que faziam a diferença entre um acordo bem-sucedido e um fracasso catastrófico.

A empresa do meu pai tinha lutado no mercado europeu. Demasiados executivos ocidentais que pensavam que podiam avançar com táticas americanizadas. Demasiados contratos perdidos. Eu assistira a acordo após acordo a colapsar porque ninguém da nossa equipa realmente entendia a cultura, a linguagem, as correntes mais profundas de respeito e relacionamento que governavam tudo.

Então aprendera. Não casualmente, mas completamente. Contratei os melhores tutores, mergulhei na língua, estudara a cultura com a intensidade que uma vez reservava para a lei corporativa. Vivera em Lisboa durante seis anos, depois mais dois entre Madrid e Barcelona. Negociava contratos valendo centenas de milhões, tudo enquanto sorria educadamente quando os clientes assumiam que eu era só mais uma rapariga americana que tivera sorte num emprego corporativo.

Deixava que me subestimassem. Os concorrentes certamente faziam-no, até ao momento em que fechava acordos que julgavam impossíveis. Quando regressei ao Porto há três meses para assumir como Diretora Operacional da Mendes Global Consulting, conseguia discutir tudo desde o sistema bancário europeu até as políticas regionais num português que faria um académico orgulhar-se.

E então conhecera Tiago Sousa num jantar de caridade. Bonito, atraente, educado na Nova School of Business. Aproximara-se de mim no bar, o sotaque quase impercetível, o inglês perfeito. Perguntara-me sobre o meu trabalho, parecia genuinamente interessado nas minhas opiniões sobre mercados internacionais. Fora atencioso, engraçado, respeitoso. Também tivera o cuidado de mencionar, nos primeiros vinte minutos, que vinha de uma família proeminente de empresários portugueses com participações vastas na Europa.

“Imobiliário, construção, importação, exportação—o tipo de império diversificado que sobrevive a crises económicas,” explicara. Eu ficara intrigada, não pelo dinheiro—a empresa do meu pai garantira que nunca me preocuparia com finanças—mas pelas oportunidades de negócio. A Mendes Global tentara entrar no mercado português durante anos, mas as ligações necessárias, a confiança a construir, estivera sempre fora de alcance.

Tiago podia ser essa ponte. No mês seguinte, ele cortejara-me com uma mistura perfeita de romance ocidental e cortesia antiga. Jantares caros, prendas pensadas, longas conversas sobre tudo desde literatura a política. Nunca uma vez me falara em português. “A minha família é tradicional,” explicara no nosso sexto encontro, enquanto caminhávamos junto ao rio.

“Vão querer conhecerE quando finalmente me casei com o verdadeiro amor da minha vida, anos depois, num pequeno restaurante à beira-mar no Algarve, ri-me ao lembrar que o melhor café que alguma vez fizera fora naquela velha máquina de cápsulas que tanto desprezaram.

Leave a Comment