Funcionária de Limpeza Leva Filha ao Trabalho e Seu Chefe Surpreendente Muda Tudo

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Era uma manhã fria em Lisboa quando Catarina acordou às cinco e meia, como sempre. Seu corpo pesado, os olhos inchados de uma noite mal dormida, mas não havia tempo para reclamações. O velho despertador da mesinha nem tocava mais, mas ela já tinha a hora na cabeça desde que o marido morrera, quatro anos atrás. Sua filha, Leonor, de apenas quatro anos, dormia profundamente, abraçada a um peluche de coelho com uma orelha caída. Catarina olhou para ela por alguns segundos antes de se levantar. Dói acordá-la, mas não podia deixá-la sozinha. Iria levá-la ao trabalho outra vez.

Movia-se rápido pelo pequeno apartamento que dividiam no bairro de Alfama. Uma casa humilde, com paredes gastas, uma única lâmpada no teto e um fogão antigo que demorava a pegar. Serviu mingau de aveia com leite quente para Leonor e café puro para si, tudo em silêncio para que a menina dormisse mais um pouco. Enquanto tomava o café, pensava em como explicar ao Sr. Afonso que a filha estaria com ela outra vez. Já tinha dito que não tinha com quem deixá-la, mas sempre achava que, a qualquer momento, diriam que não podia continuar assim, que teria de arranjar outra solução. Como se fosse fácil.

Já procurara creches, mas não podia pagar nem a mais barata, e não tinha família para ajudar. As coisas eram como eram. Às seis e quinze, acordou Leonor com um beijo na testa. A menina abriu os olhos com preguiça, espreguiçou-se e fez a pergunta de sempre. “Vais trabalhar hoje, mãe?” Catarina sorriu e respondeu que sim, mas que ia com ela, como outras vezes. Leonor acenou feliz porque gostava da casa grande. Dizia que parecia um castelo. Mesmo sem poder tocar em quase nada, ficava contente só de estar lá.

Enquanto a vestia, Catarina repetia: não faças barulho, não toques em nada sem pedir, não corras pelos corredores e não entres no escritório do Sr. Afonso. É muito importante que te portes bem, minha filha. Preciso deste trabalho. Falou com firmeza, mas suavidade. Saíram de casa às sete em ponto, como sempre. Caminharam quatro quarteirões até ao ponto de autocarro. Catarina tinha a mochila ao ombro e um saco com comida. Leonor, com a mochila rosa cheia de brinquedos pequenos e um caderno para desenhar, entrou no autocarro como todas as manhãs, no meio do aperto, e Catarina certificou-se de que ficava segura perto da janela.

A viagem durou cerca de quarenta minutos, e Leonor passou o tempo a olhar para os carros, as pessoas, os cães vadios e a fazer perguntas sem fim. Catarina respondia como podia, embora às vezes não soubesse o que dizer. Chegaram ao bairro de Lapa, onde tudo era diferente: ruas largas, árvores podadas, casas com portões eletrónicos e jardineiros uniformizados já a trabalhar cedo. A mansão onde trabalhava ficava no canto de uma rua tranquila, atrás de um enorme portão preto. Catarina teve de usar o interfone para que alguém a deixasse entrar.

O segurança, o Sr. António, já a conhecia. Sorriu ao ver Leonor e abriu o portão sem dizer nada. Catarina agradeceu com um olhar rápido, e entraram. A mansão era enorme, de dois andares, com janelas de todos os lados e um jardim maior do que toda a rua onde moravam juntas. Catarina ainda ficava nervosa ao entrar, mesmo trabalhando ali há dois anos.

Tudo estava limpo, arrumado, e cheirava a madeira fina. O Sr. Afonso quase nunca saía do escritório de manhã. Catarina conhecia bem a rotina dele: acordava às oito, descia para o pequeno-almoço às nove e depois ia para o escritório trabalhar ou saía para reuniões. Às vezes não o via o dia todo; só deixava recados para ele através do mordomo. Naquele dia, pensou que seria igual.

Entraram pela porta de serviço, como de costume. Catarina pediu a Leonor para se sentar num canto da cozinha onde pudesse vê-la. Deu-lhe lápis de cor e uma folha. A menina começou a desenhar, e ela começou a limpar, pela sala de jantar. Tudo normal.

Lavou a louça que a cozinheira deixara, varreu, passou o pano, arrumou as almofadas das cadeiras e tirou o pó do armário onde estava a coleção de garrafas caras. Às oito e quinze, ouviu passos na escada. O coração saltou. Não esperava que ele descesse tão cedo.

Afonso apareceu na sala de estar com uma camisa branca desabotoada e uma cara fechada. O cabelo ligeiramente despenteado, e trazia uma pasta na mão. Catarina congelou, com o pano na mão. Ele ia direto à cozinha. Quando entrou, parou de repente ao ver Leonor sentada no chão, concentrada no desenho. Catarina sentiu o estômago apertar. Respirou fundo, deu um passo à frente e explicou que não tinha com quem deixá-la, que seria só por algumas horas, e que prometia que não causaria problemas. Afonso não disse nada; inclinou-se um pouco, apoiado nos joelhos, e olhou para o desenho de Leonor. Era uma casa enorme com uma menina no jardim e um grande sol no canto.

Leonor viu-o e disse sem medo: “Esta é a tua casa, senhor, e esta sou eu a brincar.” Afonso pestanejou, ficou em silêncio por alguns segundos, depois endireitou-se, arrumou a camisa e, para espanto de Catarina, sorriu. Um sorriso discreto, como se algo dentro dele se tivesse desbloqueado.

“Está bem,” disse simplesmente e saiu da cozinha. Catarina não sabia o que pensar. Nunca o vira assim. O Sr. Afonso não era mal-educado, mas também não era caloroso. Era um homem sério, com um olhar duro, que quase nunca dizia mais do que o necessário. Mas aquele sorriso era algo que não esperava. Continuou a limpar, o coração acelerado, e olhava para Leonor de lado.

A menina continuou a desenhar, calma, como se nada tivesse acontecido. Às nove em ponto, ele desceu novamente. Catarina pensou que a repreensão viria agora, mas não. Afonso sentou-se à mesa da sala de jantar e pediu café. Depois, da sua cadeira, perguntou o nome de Leonor. Ela respondeu com naturalidade, como se fossem amigos. Ele perguntou-lhe o que gostava de fazer, e ela respondeu desenhar, correr e comer bolinhos. Afonso riu. Um riso baixo, mas verdadeiro. Catarina sentiu que algo estranho estava a acontecer e não sabia se devia preocupar-se ou não. O resto da manhã foi diferente. Afonso ficou mais tempo em casa.

Foi para o jardim fazer algumas chamadas, mas antes de sair, perguntou a Catarina se Leonor podia brincar lá um pouco. Ela não sabia o que dizer; só disse que sim, se não fosse incómodo, e ele respondeu que não, que gostava de a ver ali. Catarina olhou para ele, sem saber como reagir. Enquanto varria a entrada, viu a filha a correr entre os arbustos, rindo sozinha, e Afonso sentado num banco, a observar sem dizer nada.

O homem que perdera a mulher três anos antes e vivia como uma sombra desde então parecia estar a voltar à vida naquele dia. Catarina não entendia o que estava a acontecer, mas pela primeira vez em muito tempo sentiu que talvez as coisas pudessem mudar, e tudo começara como um dia qualquer. Leonor sentou-se de pernas cruzadas no jardim, a colher pequenas flores da relva e a fazer pilhasE, assim, entre risos partilhados e os primeiros passos incertos dos gémeos no jardim da casa que agora era também deles, Catarina percebeu que a vida, mesmo depois de tantas tempestades, finalmente lhe sorria.

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