Garoto Contrata Motociclistas com Seu Cofrinho para se Defender de Valentões

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Dezassete motards foram contratados por um menino para o protegerem na escola de valentões. Rapazes mais velhos ameaçaram bater-lhe por ter defendido uma rapariga com deficiência.

Achámos que era uma brincadeira quando o pequeno Marco apareceu no nosso clube com o dinheiro do seu mealheiro, perguntando se éramos “o tipo de motards que protegem as pessoas” como tinha visto na televisão.

O lábio estava partido, o olho roxo, e tremia tanto que mal conseguiu contar os euros em cima da nossa mesa de poker.

Mas o que nos contou a seguir sobre o motivo de precisar de proteção fez com que todos nós – homens adultos que sobreviveram a guerras, prisões e lutas de rua – tivéssemos vontade de chorar e de lutar ao mesmo tempo.

“Magoraram a Sara,” disse, a voz pouco mais que um sussurro. “Ela tem síndrome de Down e atiraram a cadeira de rodas dela escadas abaixo.

Eu disse à professora, mas ela respondeu que ‘rapazes serão sempre rapazes’. Depois, disseram que me iam bater muito amanhã depois da aula por ser um dedo-duro.”

O Zé Grande, o presidente do nosso clube, olhou para os sete euros em cima da mesa. O nosso preço diário por trabalho de segurança era quinhentos euros por homem. Aquele miúdo não tinha dinheiro suficiente para nos contratar nem por dez minutos.

“Miúdo,” disse o Zé com suavidade. “Nós não podemos—”

“Por favor,” interrompeu o Marco, lágrimas frescas misturando-se com o sangue seco no rosto. “A minha mãe trabalha em dois empregos. O meu pai foi-se embora. Não tenho mais ninguém. E a Sara… ela é minha amiga. Não consegue andar, magoaram-na, e ninguém quer saber. Tenho medo, mas alguém tem de a proteger.”

O clube ficou em silêncio. Dezassete motards endurecidos, a olhar para um menino de nove anos que tinha gasto todas as suas poupanças para tentar contratar proteção para si e para a amiga.

“Onde está a Sara agora?” perguntou o Zé.

“No hospital. A mãe está com ela. Partiu o braço quando empurraram a cadeira de rodas. A escola chamou-lhe ‘acidente’.” Os punhos do Marco fecharam-se. “Mas não foi acidente nenhum. O Tomás Sousa riu-se enquanto ela chorava.”

O Ruivo, o nosso braço-direito, falou. “Quantos anos tem esse Tomás?”

“Doze. Mas é grande. Muito grande. E tem seis amigos que fazem tudo o que ele manda.”

Um valentão de doze anos a aterrorizar uma rapariga com deficiência e o menino de nove anos que tentou defendê-la. E a escola a não fazer nada.

O Zé pegou nos sete euros. “Isto é mais que suficiente,” disse, sério. “Aceitamos o trabalho.”

Os olhos do Marco arregalaram-se. “A sério?”

“A sério. Estaremos na tua escola amanhã. A que horas?”

“Às três e meia. É quando as aulas acabam. Disseram que me iam apanhar no estacionamento.”

“Não vão fazer nada disso,” prometeu o Zé.

Depois de o Marco sair, segurando o recibo que o Zé lhe tinha escrito – “Serviços de Segurança Pagos na Totalidade” – o clube teve uma reunião.

“Vamos mesmo fazer isto?” perguntou o Ruivo.

“Claro que vamos,” respondeu o Zé. “O miúdo gastou todas as poupanças para proteger a amiga. Isso é mais honra do que a maioria dos homens mostra numa vida inteira.”

No dia seguinte, às três da tarde, dezassete motards chegaram à Escola Básica do Vale. Estacionámos as nossas motas em fila em frente à entrada principal e esperámos. O roncar dos motores fez com que professores e alunos se aproximassem das janelas.

Às três e meia em ponto, tocou a campainha e as crianças saíram. Ficámos parados, de coletes de couro, braços cruzados, à espera. Vimos o Marco logo — pequeno para a idade, a caminhar perto de uma senhora que empurrava uma cadeira de rodas. A Sara, presume-se, com o braço num gesso novo.

Atrás deles, vinham seis rapazes mais velhos, liderados por um miúdo que era facilmente o dobro do tamanho do Marco. O Tomás Sousa e o seu grupo. Pararam de repente quando nos viram.

“Marco,” chamou o Zé. “És tu?”

O rosto do Marco iluminou-se com alívio e incredulidade. “Vocês vieram!”

“Dissemos que viríamos. Somos homens de palavra.” O Zé olhou para o Tomás e os amigos. “São estes os miúdos de que falaste?”

“Sim, senhor.”

O Zé aproximou-se do grupo de valentões, e dezasseis motards seguiram-no. Os amigos do Tomás começaram logo a recuar, mas o Tomás ficou no sítio, tentando parecer durão.

“Tu és o Tomás?” perguntou o Zé.

O miúdo anuiu, a coragem a rachar um pouco.

“Ouvi dizer que gostas de empurrar raparigas em cadeiras de rodas escadas abaixo.”

“Aquilo foi um acidente,” disse o Tomás rapidamente.

“Engraçado. As testemunhas dizem outra coisa. Dizem que te riste enquanto ela chorava.”

O rosto do Tomás ficou vermelho. “Quem são vocês? Não podem estar aqui.”

“Somos a equipa de segurança do Marco. Ele contratou-nos.” O Zé mostrou o recibo. “Pago na totalidade. Estamos aqui para garantir que não lhe acontece nada nem à sua amiga Sara.”

Uma professora aproximou-se, aflita. “Desculpem, têm de sair. Isto é propriedade da escola.”

O Zé virou-se para ela, calmo. “Foi a si que o Marco reportou o bullying?”

Ela empalideceu ligeiramente. “Isso… isso foi tratado internamente.”

“Deixando que continuasse? Chamando a um ataque deliberado ‘acidente’?” A voz do Zé nunca se elevou, mas a raiva era clara. “Menina, uma criança foi hospitalizada. Outra criança tentou fazer o que estava certo e foi ameaçada por isso. Isso não é ‘tratar’. Isso é ignorar.”

“Não gosto do seu tom—”

“E eu não gosto que crianças sejam aterrorizadas enquanto os adultos viram a cara,” cortou o Zé. “Portanto, isto é o que vai acontecer. Todos os dias às três e meia, estaremos aqui. Vamos acompanhar o Marco e a Sara a casa em segurança. E se alguém — alguém — tocar neles, vai ter de lidar connosco.”

“Não pode ameaçar crianças!”

“Não estamos a ameaçar. Estamos a proteger. Há diferença. Uma que esta escola parece não entender.”

Já se tinha juntado uma multidão. Pais, alunos, mais professores. A mãe do Tomás abriu caminho.

“O que se passa? Tomás, estes homens estão a incomodar-te?”

“O seu filho mandou uma rapariga com deficiência para o hospital,” disse o Ruivo, seco. “Agora está a ameaçar o miúdo que o denunciou.”

“O Tomás nunca faria—” ela começou, mas o Zé mostrou-lhe o telemóvel.

“Coisa engraçada dos miúdos hoje em dia. Eles filmam tudo.” Virou o ecrã — vídeo do Tomás e dos amigos a virar a cadeira de rodas da Sara de propósito, ela a gritar, eles a rir. “Cinco alunos diferentes enviaram-nos isto. Todos com medo de mostrar aos professores porque nunca acontece nada.”

A mãe do Tomás ficou branca. “Tomás, isto é verdade?”

O silêncio do Tomás foi resposta suficiente.

“O acordo é este,” disse o Zé, dirigindo-se a todos. “O Marco contratou-nos. Trabalhamos paraE cinco anos depois, no mesmo estacionamento, o Marco, agora um jovem alto e sorridente, apertou a mão do Zé e disse: “Obrigado por me terem ensinado que a verdadeira força está em proteger quem não pode lutar sozinho”.

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