“Dou 10.000 euros se aceitares casar comigo por 30 dias”, propôs o milionário a uma jovem sem abrigo. Ela aceitou com uma condição. “Preciso que te cases comigo.” As palavras saíram dos lábios de Rodrigo enquanto a chuva caía sem piedade sobre as ruas de Lisboa, encharcando seu fato de marca enquanto se ajoelhava diante da jovem que se abrigara sob a marquise do seu edifício corporativo. Os joelhos molharam-se no pavimento, manchando o tecido italiano de lama, mas isso já não importava. Leonor Duarte olhou para cima, surpresa. Seus olhos verdes brilharam com uma mistura de desconfiança e curiosidade enquanto estudava o homem à sua frente.
Nas ruas, aprendera a ler as pessoas, e este estranho emanava uma desesperação que quase igualava a dela. “Desculpe…” A voz dela soou rouca pelo frio e cansaço. Rodrigo tirou um maço de notas da carteira, as mãos tremendo ligeiramente. Não acreditava no que estava prestes a fazer, mas as palavras do advogado ecoavam na sua mente: “Tens seis meses, Rodrigo. Seis meses para casares e permaneceres casado ou perdes todo o império hoteleiro da tua família.”
“Dou-te 10.000 euros para casares comigo por seis meses”, disse, estendendo o dinheiro. “É apenas um contrato.” Leonor levantou-se lentamente, ignorando as notas. Apesar da roupa encharcada e da situação desesperada, havia uma dignidade na sua postura que impressionou Rodrigo. “O que te faz pensar que me venderia por dinheiro?”, perguntou, cruzando os braços.
“Não é assim”, Rodrigo passou a mão pelo cabelo molhado, procurando as palavras certas. “O meu avô deixou uma cláusula no testamento. Se não me casar antes dos 33 anos e permanecer casado seis meses, perco a herança. O meu aniversário é em duas semanas.”
“E porquê eu?”, Leonor estudou-o com aqueles olhos penetrantes. “Deves ter namoradas ou candidatas mais adequadas.” Uma risada amarga escapou dos lábios de Rodrigo. Horas antes, encontrara a noiva, Catarina, na cama com o sócio comercial, Tiago Herrera. A traição ainda lhe queimava no peito. “A minha noiva traiu-me com o meu melhor amigo”, admitiu. “As mulheres do meu meio só querem algo permanente. Eu só preciso cumprir os termos do testamento.”
Leonor ficou em silêncio por longos segundos. Ao longe, o trânsito misturava-se com o som constante da chuva. “O meu irmão mais novo precisa de uma cirurgia ao coração”, disse finalmente. “O João tem 16 anos. Sem a operação, não chega aos 18.” As palavras atingiram Rodrigo como um soco. Percebeu então porque aquela mulher estava na rua. Não por drogas ou más decisões, mas por amor, por sacrifício.
“Quanto custa a cirurgia?”, perguntou. “200.000 euros.” Leonor baixou o olhar. “Estamos em listas de espera, mas o tempo está a esgotar-se.” Rodrigo guardou o dinheiro e levantou-se, sentindo a água fria escorrer pelo pescoço da camisa. Olhou-a nos olhos, vendo-a verdadeiramente pela primeira vez. “Proponho algo diferente: 200.000 euros para a cirurgia do teu irmão mais 10.000 por mês durante seis meses. Em troca, precisamos de um casamento legal. Depois, divórcio limpo.”
“E como sei que cumprirás?”, Leonor cruzou os braços. “Não te conheço.” “Contrato legal, revisado por advogados independentes. O dinheiro fica num fundo antes do casamento. Se eu não cumprir, ficas com tudo e o casamento anula-se.” Pela primeira vez, Leonor pareceu considerar seriamente a proposta. “Porque devo confiar em ti? Nem sequer sei o teu nome.”
“Rodrigo Mendes, CEO dos Hotéis Mendes, terceira geração. Podes investigar.” Leonor olhou para a mão estendida antes de apertá-la brevemente. “Leonor Duarte. E tenho condições. Primeiro: o João tem de ser tratado no melhor hospital privado. Segundo: respeitas os meus limites durante estes seis meses. Terceiro: quando terminar, ajudas-me a arranjar um emprego digno.”
Rodrigo acenou, impressionado. Esperava uma mulher desesperada; encontrou uma negociadora inteligente. “Aceito. Tens um acordo.” Leonor olhou-o fixamente. “Mais uma coisa: se descobrir que mentiste ou tentaste aproveitar-te de mim ou do João, cancelo o contrato e processo-te.” Um sorriso genuíno surgiu no rosto de Rodrigo. “Justo. Isto vai ser mais interessante do que pensei.”
Quarenta e oito horas depois, Leonor encontrava-se num escritório de advogados no 35º andar de um arranha-céus no Chiado, a olhar para um contrato matrimonial de 27 páginas mais complexo que a Constituição. “Não assines nada até eu rever”, sussurrou a advogada ao seu lado, Elisa Esperança, especialista em direito da família que trabalhava pro bono.
“Como conseguiste a melhor advogada de Lisboa?”, perguntou Leonor a Sofia, a assistente de Rodrigo que surgira na manhã anterior com pastéis de nata e uma atitude surpreendentemente calorosa. “Elisa e eu estudámos juntas”, sorriu Sofia. “Ela tem paixão por causas justas. E não é totalmente pro bono – o Rodrigo está a financiar discretamente alguns dos seus projetos.”
Na outra ponta da mesa, Rodrigo observava a interação com uma expressão indecifrável. Vestia um fato azul-marinho que provavelmente custava mais que tudo o que Leonor possuíra na vida, mas havia um nervosismo nos seus olhos. “Algum problema com as cláusulas financeiras?”, perguntou o advogado de Rodrigo, um homem com ar de quem lidara com fortunas durante décadas.
“Tudo parece em ordem”, respondeu Elisa. “O fundo para a cirurgia ativa-se após a cerimónia. Os pagamentos estão garantidos e a cláusula protege a minha cliente.” Leonor sentiu um nó no estômago. Parte dela ainda esperava acordar do sonho, voltar ao seu quarto alugado e às contas médicas impagáveis.
“Tens a certeza?”, perguntou Sofia em voz baixa. “Ao assinares, não há volta atrás.” Leonor pensou no João, que naquela manhã tivera outro episódio de fadiga extrema a caminho da escola. Pensou nas noites em claro, a ouvir a respiração irregular do irmão, nos médicos que diziam que sem a cirurgia, ele teria sorte em chegar ao próximo aniversário. “Tenho a certeza”, disse, pegando na caneta.
Na manhã seguinte, a cerimónia civil no registo civil durou exatos 18 minutos. Leonor usava um vestido azul-marinho escolhido por Sofia e um ramo de flores brancas compradas na última hora. Rodrigo parecia nervoso no fato cinza, as mãos tremendo ligeiramente ao colocar a simples aliança de ouro no dedo dela. “Pelo poder que me é conferido, declaro-vos marido e mulher”, disse o juiz com a monotonia de quem repetira aquelas palavras milhares de vezes.
O beijo foi breve, quase um roçar de lábios, mas quando Leonor olhou Rodrigo nos olhos, viu algo inesperado: respeito genuíno. Três horas depois, sentavam-se no consultório do Dr. António Silva, o melhor cardiologista pediátrico de Lisboa, enquanto o João ouvia atentamente. “A boa notícia é que a tua condição é operável”, disse o médico. “Com a cirurgia, terás uma vida completamente normal.”
Leonor sentiu as pernas desfalecerem de alívio. “Quando pode ser feita?”, perguntou Rodrigo. “Na próxima semana. Mas o João precisará de seis semanas de recuperação.” O rapaz, que permanecera calado, falou finalmente: “Posso terminar a escola?” “Claro”, sorE quando as luzes da festa de casamento se acenderam no terraço do Hotel Avenida, com vista para o Tejo, Leonor percebeu que aquele contrato improvável tinha acabado por lhe dar não apenas a cura para o irmão, mas também um amor verdadeiro que duraria para sempre.